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monografia

UM CASO DE PARANORMALIDADE SOB A ÓTICA DA PSICOLOGIA JUNGUIANA

3. A RIQUEZA DO PSIQUISMO HUMANO

 

O Ser e o Existir 

 

Um dos objetivos desta monografia é o de tentar legitimar diante das teorias do conhecimento, as percepções extras sensoriais (PES) de Clarinha ao longo da sua história. Um ser humano de perfil “incomum” e que possui como parte integral do seu ‘ser’ e do seu ‘existir’ uma ascendência familiar com um histórico de vivencias paranormais. A herança espiritual partiu da sua prima Bel que, aos 15 anos, apresentava manifestações mediúnicas dentro do grupo familiar canalizando uma índia, Jurema da Mata Virgem e que, posteriormente passou a experienciar esta mediunidade no centro umbandista no interior piauiense.

  

Abraçar a missão fraterna nas PES de Clarinha configurou-se, em nós, grandes desafios pelos caminhos sagrados. Instalou-se no âmago do nosso ‘ser’, vários questionamentos e indagações, algo parecido como ‘fuga’, ‘medo’ e ‘inseguranças’ diante do quadro de incertezas. Cujas noites de insônias nos abateram energeticamente associadas aos desafios que se anunciavam diante deste processo sutil para o qual não estávamos habilitadas.

 

Entretanto auxiliá-la através da ajuda e gestos amorosos conseguiram solucionar em parte os seus problemas e dificuldades existenciais. Uma parceria que deu certo como amiga de infância, confidente e profissional de saúde.

 

De imediato procuramos conhecer as teorias da Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung, e ainda, orientações de estudiosos da mente humana, como verdadeiros pilares para a concretização dos objetivos desejados. Somada a isso, as pressões sutis que nos foram impostas de todas as direções, atingiam a nossa individualidade. Os bloqueios energéticos e a baixa frequência vibracional nos desconectavam com o absoluto (Deus), a ponto de temer não encontrar bibliografias compatíveis com as propostas formuladas por nós. Entretanto, sanados todos os conflitos o acolhimento ressurgiu de modo claro, evidente e integral.

 

Diante do processo ‘em busca do conhecimento’, as subjetividades de Clarinha tornaram-se parte integrante da nossa existência. Os seus sonhos recorrentes e as intuições exacerbadas ora analisadas através dos fundamentos da teoria de profundidade fluíam ordenadamente, algo parecido como os ‘conteúdos’ que tipificam as “incursões aleatórias do inconsciente” e nos reportam ao existir de Jung para existir de Clarinha. Eventos similares que ocorreram com Jung em situações idênticas quando iniciou as suas ‘faculdades paranormais’. E igualmente ao se confrontar também com a sua inconsciência, analisando os relatos dos seus pacientes, bastante influenciados pelos “fenômenos espirituais”, vivenciados também, em sua casa e em sua prima Hélène.

 

Dentro deste contexto fenomenológico assim se expressa Kardec (1972, p.33 apud ARGOLLO, 2004, p.33) sobre a existência desses episódios: “Designamos assim, (médiuns sensitivos) as pessoas suscetíveis de ressentir a presença dos Espíritos por uma vaga impressão, uma sorte de roçagem sobre todos os membros, da qual elas não podem se der conta”. 

 

A nossa tarefa a partir de então foi auxiliar uma pessoa sensitiva tomando por base as experiências de Jung nos aspectos que nortearam aquele vivenciar sutil face ao ‘existir’ de Clarinha. Significou para nós um verdadeiro presente concedido pelo Universo. Uma tarefa de longo alcance fenomenológico e acadêmico que, uma vez cumprida todas as etapas dos questionamentos dela, enquanto sensitiva, fui paulatinamente ‘treinada’ a responder estas suas indagações que envolvem as PES. Entretanto para entender profundamente a paranormalidade da amiga, torna-se pertinente compreender os detalhes de sua vida, quer dizer na infância, na adolescência e na idade da razão. Ficar atenta aos seus eventos nas questões do ‘sobrenatural’, tanto individualmente como membro de grupos e comunidades, inferindo além das suas percepções normais. Retrocedendo às vivências sutis desta jovem, vale recordar as reminiscências de sua infância feliz. Um vivenciar sutilezas diante da natureza rodeada de surpresas por todos os planos, oriundos do planeta Terra ou dos espaços siderais. Momentos ‘numinosos’ ou ‘sagrados’ e ricos de magias. Com um elevado grau de sensibilidade, a amiga se permitia visualizar ‘percepções incomuns’ e inconscientes sobre o perfil das pessoas e situações, para a qual Jung (2006) denominou de ‘função intuição’. Um jeito especial de pensar sutilezas e se autodefinir, nas questões do simbolismo dos sonhos e fantasias do ‘sobrenatural’ daquela época, sem apoio psicológico do terapeuta e das teorias do conhecimento.

 

Marie-Louise Von Franz (1990, p.45), estudiosa dos sonhos e ex-discípula de Jung enfatiza:

 

Cada sonho que temos dentre milhares no decorrer da nossa vida, é único. Uns são diretos, outros mais complexos, mas todos os sonhos são espontâneos e imprevisíveis. É, portanto surpreendente observar que muitos deles têm uma estrutura identificável, um arcabouço a partir do qual se organizam.  

 

Ansiosa, nos momentos de conflitos consigo mesma, Clarinha preocupava os seus pais, irmãos, amigos e professores. Melancólica, adentrava numa espécie de casulo particular; enquanto que nas situações de grandes percepções, transformava-se no ‘portal’ da sua insegurança. Desconectava-se da realidade psicofísica, tornando-se levemente ausente de si mesma, para interagir nas dimensões de outros mundos. Solitária, apresentava dificuldades na escola ou na família. Esquiva, não cantava e nem se divertia. Deslocava-se do ambiente no qual deveria estar inserida, para entrar num profundo estado de subjetividades e instalava-se no nível mais profundo da sua individualidade, ansiosa e cheia de mistérios.

 

O seu grupo familiar era composto por sete irmãos incluindo seus pais. Destacou-se por apreciar histórias de assombrações e igualmente, pela capacidade de manifestar-se dentro da família como uma jovem corajosa e intuitiva. Em alguns momentos da sua infância demonstrava prazer em permanecer sozinha, talvez tentando se conectar com as outras dimensões. Por outro lado, no seu grupo de folguedos revelava-se uma líder. Todas as brincadeiras tinham como marca registrada um modo todo especial de interagir com ‘sabedoria’, o que ficou evidente nas brincadeiras de rodas nas noites de lua cheia. Um temperamento ‘incomum’ a tornava atraída pelas histórias misteriosas, a existência de bruxas feiticeiras, casas mal assombradas e velhos fantasmas, os ‘predadores do Universo’.

 

Quando distraída e profundamente solitária, conseguia adentrar nos reinos do seu psiquismo e refletia a liberdade dos pássaros: “Como eu gostaria de entender o ‘chilrear sutil’ das andorinhas, quando em revoadas para se abrigarem das intempéries das noites cósmicas” (CLARINHA, 2000, p.98).

 

Noutras ocasiões demonstrava uma relação toda especial com o seu cachorro de estimação, o verdadeiro guardião da casa e da família que atendia pelo nome de “Rompe Ferro”. Nome “Valente” e bastante poderoso, escolhido pelo seu genitor. Para os familiares era “um cãozinho amoroso” que suscitava segurança àquele espaço físico por ocasião das chuvas e tempestades.

 

Um jeito bucólico de ser da natureza, os arbustos ornamentavam os arredores da sua modéstia casa de campo. Um tapete de gramas nativas daquele quintal servia de palco para as brincadeiras de “esconde- esconde” e igualmente de apoio à farta alimentação, ao grande número de pássaros e andorinhas, que por lá vadiavam. Aquela geração era a dona da natureza verdejante, cheia de cores e de mistérios. O doce cenário compartilhava com ela, como um fiel escudeiro. A parcela de chão multicor, rico de fruteiras e lindamente enfeitado com as rendas deixadas pelos reflexos amarelos do sol nascente, inspirava a amiga às sutilezas da vida. O transpassar dos raios solar naquelas folhagens sutilmente alimentadas pelas energias “prana”[20], invadia os espaços mais íntimos do seu ‘ser’ e a tornava cada dia mais desperta para trilhar os caminhos  sagrados. 

 

Nos espaços da interatividade dela com a “mãe natureza”, costumava construir as casas das suas bonecas suspensas nos galhos das mangueiras. No seu mundo ‘imaginário’ sonhava ser um dia, a mãe de uma linda criança. Suas arquiteturas elevadas eram ricamente decoradas com os arranjos florais, colhidos da natureza. Autentica, ostentava os dons da decoração campestre e nos permitia vislumbrar nas ações da amiga, a construção de um modelo similar aos “jardins suspensos” da Babilônia[21].                            

 

Neste oásis de alegrias e em clima de doce infância, Clarinha construía algumas pontes, com a areia molhada e que fora extraída dos arredores da casa. Naquela ingênua ocupação edificava hospitais e casas de saúde, mas tudo de “mentirinhas”. A sua ‘imaginação criativa’ dava vazão às suas subjetividades no decorrer dos seus dias. E nesse vivenciar sutil, quantas vezes indagou-se a si mesma! Como, por exemplo, se em algum momento da sua vida seria ou não, capaz de voar pelos espaços siderais, mediante comportamentos inusitados, tal qual o “ziguezaguear dos pássaros”, quando ansiosos, perscrutadores ou ricos de energias. Contemplava altaneiros, os retalhos da liberdade dos pássaros nas fugas em revoadas, fugindo, talvez dos predadores e cativeiros domésticos.  

 

A destemida amiga tinha algumas particularidades que a tornavam no dia-a-dia corajosa e aventureira. Gostava de saltar do seu trapézio, que fora improvisado com madeira e cordas, a partir dos galhos suspensos das mangueiras que circundavam de gratuita beleza os arredores da sua casa. E nesse movimento do ‘ir e vir’ desses balanços efêmeros, Clarinha jogava-se no espaço/tempo, até alcançar o apoio da cerca mais próxima do seu sítio, para imitar um pássaro voador. Tentava voar a fim de se equilibrar docemente, com a sabedoria das suas asas sutis. A intenção dela seria voar em direção ao esplender de um céu índigo ou da natureza verdejante. Quer dizer, para a amiga, esse comportamento livre de ser, dava-lhe a nítida sensação de que “voar” em direção à cerca, era como se ela voasse em direção ao cosmo, um dos seus maiores desejos durante o seu trilhar infantil. 

 

As ‘alquimias’ de Clarinha, eram realizadas nos galhos das goiabeiras. O seu laboratório experimental servia para dar vazão à sua criatividade, aos seus sentimentos subjetivos e asas à imaginação. Aqueles significados mais próximos do seu ‘ser’, na tentativa de desvendar mistérios que o Universo lhe proporcionava como “experimentos–chaves”. Ocasião em que ela observava a natureza, as pedras, rios e riachos distantes dos experimentos científicos e/ou matemáticos como faz a ciência. 

 

Clarinha comandava o espetáculo das brincadeiras noturnas. O espaço das varandas da sua residência transformava-se num verdadeiro teatro e as danças improvisadas se estendiam até altas horas. As cadeiras e os lençóis da sua casa decoravam o ambiente para dar lugar à privacidade daquele espetáculo ao ar livre. Nas noites chuvosas a amiga sentia insônias, a fiel companheira nas indagações e questionamentos sutis pelo viés do firmamento. A

sua‘biodimensionalidade particular e universal’, manifestava-se.

 

Outro fato interessante marcou os dias da frágil amiga do interior piauiense. Manter consigo um livreto de sonhos[22] e na palavra chave desse material onírico, procedia as considerações empíricas das suas vivências subjetivas, ao seu grupo de amigas. O fiel escudeiro e expectador das suas buscas no tocante aos significados do sobrenatural. Diante desse material exposto, um imenso pavor estendia-se sobre a garotada. E enquanto as lendas das Fadas, dos Lobisomens e dos Sacis Pererês e a existência de casas mal assombradas aguçavam a sua mente, para os demais amigos tinham conotações diferentes.

 

Com o passar dos dias Clarinha adquiriu o hábito de anotar seus sonhos numa agenda diária e, igualmente consultar naquele livreto o seu vivenciar sutil para posteriormente refleti-los, pois para ela aqueles sonhos poderiam talvez no futuro distante representar os subsídios de todo um simbolismo universal do seu psiquismo, ou talvez, um sinal do que ainda estaria por vir.Num dado momento dos nossos contatos, ouvimos da própria Clarinha, uma singela declaração - que não sabia como esse livreto de sonhos veio parar em suas mãos e assim se expressa: “Já que esse livreto surgiu na minha vida, quero mantê-lo guardado a ‘sete chaves’ e escondido debaixo do meu travesseiro para questionar os meus lampejos [...]” (CLARINHA, 2000, p.45).

 

O certo é que o livreto de sonhos preenchia em larga escala as suas horas de ócio. E entendemos que este material rico de sabedorias foi considerado por ela durante sua infância como os conteúdos de suma importância nos momentos do seu caminhar. Visto que os ‘conteúdos’ contidos nele foi um fiel companheiro na arte de desvendar os mistérios dos seus sonhos, e compreender os seus pesadelos por ocasião da imensidão das noites.  

 

Diferente das amigas, Clarinha jamais sentiu pavor das sutilezas da vida e nem das noites ‘mal assombradas’. Contra este suposto pavor, apoiava-se na mini oração que aprendera com a sua genitora, e que passou a recitá-la diariamente antes de adormecer para se guardar das inseguranças noturnas. Um gesto realizado por ela e notadamente recitado em voz alta e de joelhos.

 

“Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador 

Só a ti me confiou à piedade divina, 

Sempre me rege. Guarde-me. Governe-me. Ilumine-me

“Amem” (Oração com aprovação eclesiástica).                                                          

                                                                                                                                     

Recordamos plenamente, como se fora hoje, que os fatos que irrompiam no inconsciente de Clarinha iam se configurando no interagir de si mesma. Contudo procurava evoluir e por em prática a sua criatividade. Jamais se deixava abater e transparecer preocupações diante dessas sutilezas, pois sempre procurou comportar-se como uma garota feliz. Jamais se deixou tragar pelas ‘sabotagens’ do seu inconsciente ou anular-se como pessoa ‘especial’ que é, e nem se “dissociou” da sua realidade psicofísica enquanto sensitiva e dotada de dons sobrenaturais.  

 

Diante das evidencias sutis, observamos que o processo espiritual e sensorial de Clarinha evoluía, na medida em que ela crescia. Motivada, sobretudo, a alçar novos vôos pelos espaços da sua existência, em busca do autoconhecimento. 

 

Adolescente Médium e Mística 

 

Durante a transição da sua infância para a adolescência, Clarinha vivenciou grandes desafios próprios da idade. Os seus problemas e dificuldades existenciais foram carregados de várias questões e permaneceram durante longos períodos da sua vida sem respostas. Entretanto, com a sua sábia curiosidade, ela encontrou nas cartas do Tarô uma espécie de compensação para as suas indagações. As figuras coloridas diante dela, a atraiam fortemente e tinham poderes adivinhatórios. Um simbolismo especial imaginava. Aquelas cartas coloridas pareciam transmitir os significados dos mistérios interiores do seu existir e desvendava as suas eternas magias.

 

Sallie Nichols (2007, p.18) ex-discípula de Jung, define as cartas do Tarô como mensagens da mente universal: [...] um baralho de cartas misterioso de origem desconhecida. Tendo pelo menos, seis séculos de existência, é o antepassado direto das nossas modernas cartas de jogar. No decorrer das gerações, as figuras pintadas nessas cartas desfrutaram de muitas encarnações.   

 

As pesquisas sobre os oráculos nos fizeram entender que as figuras do Tarô transmitiram à sua individualidade um referencial simbólico, ou seja, representavam o espelho do seu pensamento inconsciente, e um instrumento terapêutico das suas ‘projeções’. Através desses oráculos, Clarinha encontrou respostas às suas indagações e dos amigos, quando era solicitada. 

 

De acordo com Clarinha, a sabedoria Oracular proporcionou-a, quando adolescente e na idade da razão, momentos de encantamentos e eternas magias. Porque se trata dos sistemas simbólicos mais antigos da humanidade, cuja beleza e magia são movidas por aspectos ‘divinatórios’.Como simbolismo, esses oráculos continuam interpretando o ‘existir’, em seus diversos níveis, ao fazer a ponte entre o ‘conhecido e o desconhecido’. Perante os seus significados, essas cartas são consideradas uma síntese das ciências herméticas como a Cabala, a Alquimia, a e Astrologia.

  

Enquanto fantasias, aqueles oráculos lhe remetiam pensamentos, com uma série de atributos psicológicos novos e pouco habituais. Entretanto ajudava Clarinha a questionar quanto à existência de vida após a ‘morte’, ‘reencarnação’ e a presença de ‘espíritos errantes’. As suas indagações, nestes aspectos, geravam promessas, se estas sutilezas poderiam conviver ou compartilhar com os seres humanos na natureza circundante beneficiando ou ajudando alguém. Indagava-se, ainda, se esses conteúdos guardados nos porões do seu inconsciente atestavam um modo subjetivo seu e diferenciado de encarar a vida, fora dos padrões normais, da maioria das pessoas da sua idade, eis a questão.

 

No clima, de grandes descobertas pelas coisas sutis já percebíamos na garota um ser bastante sensível, consubstanciada, talvez, pela riqueza das benesses do Poder Absoluto e da natureza circundante. Vivenciando o seu cotidiano desperta e aceitava mais uma das parcelas de sua vida, integrada ao Cosmo. Parcialmente poderosa, diante das potencialidades de um “perfil incomum”.

 

Os seus dos doze anos, foi o período em que Clarinha percebia-se mais suscetível às ‘coisas’ do sobrenatural. O momento no qual eclodiam sonhos estranhos. Alguns, interessantes, outros, pavorosos e assustadores. Suas fantasias giravam em torno de como ‘voar para os espaços siderais’ sem ter as famosas asas dos pássaros da natureza. 

 

Foram estas as indagações que a amiga fazia a si mesma e que em nenhum livro ela encontrou respostas e/ou explicações para esses eventos. Apesar de não encontrar as respostas às suas indagações, contentava-se ser apenas um ‘ser pensante’, magrela, leve, livre e solta, mas que independente da sua vontade, interagia na realidade psicofísica, conectando-se simultaneamente em duas dimensões. 

 

A sensação percebida por Clarinha nos levou a entender que tinha sido aberto as comportas para os confrontos com o seu inconsciente. Essas mensagens não apresentavam ainda nenhum significado para ela, contudo, nossa amiga elaborava as suas constantes indagações, “eu vivenciei sonhos ou ilusões?” (CLARINHA, 2000, p.4). 

 

Nos inúmeros encontros para conversar sutilezas, compreendemos que a amiga crescia     e se desenvolvia como ‘ser pensante’ e as suas experiências paranormais iam se configurando e intensificando-se. Quando completou 15 anos, deu início às suas experiências mediúnicas e os episódios vivenciados por ela, tinham bastante semelhança com as vivências subjetivas de Jung e igualmente com os xamãs. Estas experiências foram reprimidas por ela, por várias razões, por exemplo, a do preconceito, rejeição e discriminação familiar por parte dos seus genitores, principalmente do seu pai. 

 

Em seguida a amiga passou a frequentar sessões espíritas, na residência de um familiar seu que é médium. Atitude que sempre adotou longe dos seus genitores e outros familiares mais distantes. As suas visitas às reuniões espíritas geralmente foram acompanhadas pelas irmãs, que eram bastante curiosas e questionavam também aquela filosofia de vida. No entanto ela e as irmãs frequentavam as reuniões escondida dos pais no centro umbandista de sua cidade.

 

Certa ocasião, Clarinha nos fez revelações importantes sobre as suas ‘subjetividades’. A primeira manifestação mediúnica ocorreu ao adentrar no centro umbandista quando interpreta intuitivamente, de modo claro e sereno, um cântico de louvor aos presentes, cujos versos estavam implícitos uma excelente mensagem de fraternidade universal. Este canto falava da Caridade da Fé e da Esperança. Sendo que a Fé foi entendida pelos presentes como a detentora de  todas as virtudes na escala da evolução espiritual.

 

O Cântico de louvor acima referenciado assim se resumiu: “A fé remove montanhas, é a lei do Salvador, dá Esperança aos que sofrem Caridade a implorar. Essa força unificada vem dos pés de Oxalá. Só as três unificadas podem o bem praticar”. 

 

Este canto de louvor, captado de modo sutil pela amiga, até a presente conjuntura, é cantado no Centro Umbandista de Jurema da Mata Virgem, localizado no litoral piauiense. A entidade que se manifestou no momento do evento, identificou-se como sendo um Índio Tupi da “tribo dos guaranis”. 

 

Após esta percepção auditiva, Clarinha começou a fazer atendimentos de curas da seguinte forma: O índio se manifestava nela e fazia várias consultas. Certa ocasião levou  à cura  uma garota de 12 anos de vida que vivia nos hospitais da cidade, sofrendo com uma infecção dermatológica generalizada. Esta garota foi tratada espiritualmente pela entidade de Clarinha e sarou em poucos dias. O tratamento ao qual foi submetida incluiu apenas banhos de sal grosso, de folhas de arrudas e mentalizações em busca da cura.

 

Com estas visitas ao centro, a amiga evoluiu e ficou bem mais perceptiva. Quando canalizava o índio, desenhava pontos, verdadeiras circunferências, e no interior desses desenhos a representação de dois símbolos, o ‘arco’ e ‘flecha’, que, segundo ele, eram forças espirituais do Universo que curavam os corpos sutis do ser humano em seus momentos de fragilidades. 

 

Por sua vez Jung pontuou essas circunferências como “mandalas”, círculo mágico, símbolo da meta e do si mesmo. E enfatiza: [...] em sânscrito, significa círculo. Este termo indiano designa desenhos circulares rituais. Ela ajuda a concentração, diminuindo o campo psíquico circular da visão, restringindo-o até o centro [...] A meta da contemplação dos processos representados na mandala é que o iogue percebe (interiormente) o deus, isto é, pela contemplação ele se reconhece a si mesmo como deus, retornando assim da ilusão da existência individual à totalidade universal do estado divino (JUNG, 2007, p.351-353).

 

Nesta fase de sua vida, Clarinha tornou-se mais sensitiva por ter vivenciado experiências umbandistas e no centro espírita convencional. A partir daí nós consultamos artigos e revistas espíritas para nos auxiliar nas questões sobre as percepções sensoriais. Pesquisamos a vida de médiuns que se destacaram dentro da filosofia, principalmente sobre as ações do sensitivo Chico Xavier. As nossas leituras tinham por objetivo, entender o que se passava no âmago do ser humano enquanto sensitivos. Enfim, pretendíamos estar habilitada dentro da filosofia espírita pelos caminhos da existência. 

 

Dentre as obras espíritas, estudamos o ‘Evangelho Segundo o Espiritismo’ de Allan Kardec, cujas informações mais detalhadas sobre essas questões doutrinárias contribuíram significativamente para auxiliá-la de modo fraterno. No decorrer dos nossos estudos, detemonos especialmente nos textos doutrinários sobre a existência de espíritos, do exercício da afabilidade, da paciência, da doçura, da obediência, da resiliência, da caridade, da temperança, do amor e do perdão. Quais as verdades e virtudes que devem ser contempladas como a súmula dos itens expressivos do Evangelho que rege a doutrina espírita.

 

A partir do conhecimento da filosofia, os textos pesquisados levaram-nos a exercitar a grandes reflexões sobre a nossa função como ‘ser pensante’ diante do mundo e do Universo. E, igualmente, o dever de apoiar os sensitivos pelos caminhos do sagrado. Um chamado importante a todos os mortais que habitam esse planeta cuja visão missionária e fraterna assim se resume: As grandes vozes do céu ressoam como o som da trombeta e os coros dos anjos se reúnem. Homens, nós vos convidamos ao concerto divino, que vossas mãos tomem a lira; que vossas vozes se unem, e que num hino sagrado se estendam e vibre de uma extremidade a outra do Universo (KARDEK, 2005, p.6).

      

Idade da Razão ou Deusa Dividida?

 

Seguindo o curso da vida, traçado como uma flecha do tempo, Clarinha chegou à fase adulta enfrentando dificuldades inerentes às pessoas que vivenciam situações classificadas como paranormais. Resistiu às investidas críticas, sem ter qualquer apoio para um equilíbrio emocional compatível com o seu momento. Uma convivência ‘intramundos’ enfrentando-se a si mesma, sob os estigmas impostos pelo comportamento da sociedade que abomina ou ignora considerações desta natureza. 

 

A partir deste momento Clarinha passou a dar bastante importância à comunicação sutil entre as pessoas e aos seres “aeriformes” (espíritos). Procurou manter esta chama acessa em sua alma, como um modo sutil de ajudar os seres humanos que, como ela, experienciam problemas e dificuldades sensoriais pelo viés da existência. Dotada de um temperamento extrovertido, ela conseguia despertar nas pessoas que somos capazes de viver a alegria de sentir a fluidez da vida nesta, e em outras dimensões. E, ainda, passar uma mensagem bastante amorosa em tudo que se compromete fazer e realizar no processo de cada existência individual. Clarinha externa que quão maravilhoso é perceber o espetáculo energético e vibracional que emana do cosmo.

 

Ela se refere a uma luminosidade incandescente, tais quais os tons brancos de cristal, dos vermelhos, das laranjas e ou dos amarelos, associados aos tons multicoloridos do arco-íris e do grande Sol Central. Igualmente poderosos, os tons dos verdes, dos índigos ao violeta, tonalidades de alto poder curativo e energético, que são presenciados por ela em outras dimensões. De fato, as tonalidades das cores acima mencionadas, elevam a nossa frequência vibracional e têm verdadeiros poderes de cura. Extasiada com a sublime e indescritível beleza, Clarinha declara que escolheu para alimentar os seus corpos sutis, o ‘violeta’ que representa a cor da transmutação.

 

Neste cenário de luzes, a amiga percebe de modo sutil que esses eventos são movidos por milhares de milhões de fótons ou partículas de luz, que enriquecem e energizam a humanidade carente de amor e ‘sabedoria’. Neste espetáculo são canalizadas as mensagens oriundas dos mestres da espiritualidade, uma espécie de ‘chamamento’ para trilhar pelos caminhos da luz, da paz, do amor e da Sabedoria.

 

Nesta fase de total crescimento espiritual Clarinha recorda as ‘projeções’ de suas vidas passadas através dos sonhos, das noites cósmicas, das suas visões e intuições exacerbadas. Quando em vigília ou em estado desperta, costuma percebe-se em outras dimensões, vivenciando as tarefas de uma mulher cigana, corajosa, cheia de desejos e fantasias sobre os mistérios do existir. E, igualmente como membro integrante de uma comunidade de ciganos. Em outro momento, revive um período com os seus pares (familiares e amigos), vezes dançando ou jogando as cartas do seu minúsculo Tarô.

 

Em outros períodos dessas ‘viagens sutis’, Clarinha vivenciou outras práticas das magias e encantamentos nas noites de lua cheia. E se reconheceu participando livremente das festas dos batizados e casamentos, dentro dos rituais ciganos. Noutros eventos se deixa perceber atuando como médica sensitiva e ‘refém’ da Inquisição, no período da Idade Média. Um tribunal eclesiástico da Igreja Católica que costumava castigar ciganos, bruxas e feiticeiros por não admitirem qualquer pensamento que contrariasse os seus dogmas religiosos. 

 

Foram observados também, que seus sonhos recorrentes revelam a evolução e crescimento espiritual quando se permitia também ‘projetar’ um período da sua vida desde o tempo em que era criança, de dois para três anos. Entretanto, observamos que com o passar dos anos, seus sonhos já se apresentavam de modo diferenciados em sua essência. Sonhos que envolviam uma alegoria espiritual de outros mundos. Percebendo-se ‘adulta e íntegra’ em sua totalidade máxima que, de acordo com ela, essas projeções continuam vivas e presentes em seu existir. Foram estes os episódios que marcaram a ‘alma’ de Clarinha. Na íntegra, um pequeno texto extraído do seu Diário particular que somam esta visão do ponto de vista psicológico e emocional no qual ela se encontra agora.       

 

Em certa manhã (já adulta) me percebi criança, de dois para três anos, caminhando num deserto em direção ao sol nascente. Não estava sozinha, mas na companhia de um mago vestido de cristal. Na minha santa ingenuidade, não demonstrei nenhum interesse pela caminhada. Uma atitude normal para uma criança da minha idade (CLARINHA, 2000, p.13).

 

Diante de tantas informações procedentes do Cosmo, a amiga nos confidencia, a todo minuto e a toda hora, que prefere acreditar ser uma pessoa tão normal quanto os seus pares. Sendo assim, se aceita como sendo uma verdade ‘indivisível’, porém, com suas peculiaridades naturais. Dotada de poderes extra-sensoriais, que a possibilitaram experienciar os seus eventos e seus mistérios no planeta Terra e simultaneamente conectada ao cosmo. Em tempo recorde, fazer uso deles, somente para praticar o bem, confiante, consciente e sem receios.Dirigir os seus projetos e participar da vida sob uma visão do mundo em duas dimensões, eis a questão!

 

O mundo imaginal, antes de tudo, é um mundo que nos desafia a superar nossas dificuldades [...] por causa disso percebemo-nos, num acontecimento que lembra os contos de fada [...] organizado a partir de um ponto central. A este denomino o cerne do Si Mesmo (PIETTER MIDDELKOOP, 1996, p.11).

 

Clarinha costuma revelar que, no ato do seu ‘existir’, lança mão da sua coragem e inteligência para colocar seus projetos em dia e se relacionar com os seus semelhantes, nas incessantes buscas pelas verdades, com as quais se identifica. Ela entende que o ser humano continua a se questionar onde encontrar as “verdades temporais” sobre a existência do ser humano e em quais teorias científicas acreditar. 

 

Então para esta jovem, o ato do existir conscientemente, é fundamental. Faz parte do existir de todo ‘ser’ o desejo de aspirar para si e para toda humanidade a plenitude no amor divino. Configurar-se como parte integral do mergulho ‘consciente’ pelos caminhos sagrados e no ritmo de fragmentação das suas partes (alma mente e corpo físico). Para tentar a recuperação do ‘elo transcendental’ que fora perdido nas convivências humanas, no ‘aqui e no agora’, nesta, e em outras dimensões da quintessência[23]. 

 

Uma das principais tentativas de Clarinha é clamar pela existência de uma sólida fundamentação científica que possa ‘avaliar e validar’ a fenomenologia paranormal. Compreende que as pessoas envolvidas nesse sistema sutil, possam interagir conscientes com as ocorrências que normalmente envolvem as PES (viagens astrais, sonhos recorrentes, premonições, precognições, clarividência, clariaudiência e psicocinese) e outros eventos do gênero.  

                         

Um Despertar Interior   

 

O Jung (1971) em seu livro Psicologia do Inconsciente dá uma visão geral do processo do autoconhecimento de um ser, para que o mesmo chegue às suas origens, às verdades individuais e consequentemente à sua essência, nos direcionamentos da sua vida.

               

Quando Jung elaborou os conceitos sobre o inconsciente baseou-se no estado de pós-guerra (primeira guerra mundial) em que eclodiu uma gama de problemas de ordem psíquicos, vivenciados pela clientela fragilizada, como uma resultante fulminante deixada por ela. Os saldos negativos do modo daquele vivenciar atingiram em cheio seus pacientes, e consequentemente as suas almas.

                              

Com a sua sabedoria intuitiva, ele elaborou o ‘princípio de individuação’ i, é; um processo terapêutico que operacionalizado no limiar do intelecto da Alma, tende a se realizar, germinar e crescer. Para Nise da Silveira (1997), a individuação inclui o desenvolvimento das potencialidades de um ser mesmo que inconscientemente mobilizados por forças instintivas, tende a acontecer beneficiando sobremaneira o fortalecimento do ser humano sob atendimentos terapêuticos. 

 

O homem é capaz de tomar consciência desse desenvolvimento e de influenciá-lo. Precisamos no confronto do inconsciente com o consciente, no conflito como na colaboração entre ambos é que os diversos componentes da personalidade amadurecem e unem-se numa síntese, na realização de um indivíduo específico e inteiro [...] Aquele que busca individuar-se não tem a mínima pretensão a tornar-se perfeito. Ele visa completar-se, o que é muito diferente. E para completar-se terá de aceitar o fardo de conviver conscientemente com as tendências opostas, irreconciliáveis [...] tragas estas as colocações do bem ou do mal (SILVEIRA, 1997, p.77-78).

 

No processo de Clarinha, o acúmulo de dificuldades “bio-psico-sociais” e energéticas, não tiveram aquelas repercussões devastadoras procedentes dos momentos conflituosos de um estado de pós-guerra, acima referido, época na qual o cientista tratava dos seus pacientes em Zurique. Mesmo tendo um vivenciar sutil menos doloroso daqueles clientes de Jung, Clarinha entrou no processo de fragilização das suas partes (alma, mente e corpo físico) tornando-se pertinente realizar a sua ‘individuação’, e elaborou satisfatoriamente a cura compatível com os seus anseios. 

 

O seu perfil psicológico evoluiu e adentrou nos reinos do seu psiquismo, fortaleceu o seu ‘ego’, e uma vez habilitada passou a exercer as suas escolhas no ‘aqui e agora’ com sabedoria e mestria. E, compreendeu que o processo da ‘individuação’ desde que bem conduzido, é salutar ao ser humano; abre as portas para as suas realizações pessoais, e autodeterminação consciente em busca do conhecimento como descreve Silveira (1997 p.16-17). 

 

O processo de individuação não consiste num desenvolvimento linear. É um movimento de circunvolução que conduz a um novo centro psíquico. Jung denominou esse centro self (si mesmo). Quando consciente e inconsciente vêm ordenar-se em torno do self, a personalidade completa-se. O self será o centro da personalidade total, como o ego é o centro do campo do consciente [...] Para que o indivíduo não seja tragado pelo consciente, adverte Jung, é necessário manter-se firmemente enraizado na realidade externa, ocupar-se da sua família, ocupar-se da sua profissão. E sem perder o ânimo e encarar face a face às imagens do inconsciente. 

    

Estes seguimentos terapêuticos auxiliaram-na a restabelecer-se com as suas verdades. Um sentimento sutil que normalmente acometem os sensitivos desprovidos de apoio terapêutico e que uma vez, desconectados da sua realidade psicofísica, perdem a alegria de viver na completude do ser. Entretanto, apesar das ‘voltas que o mundo dá’ as fragilidades da amiga foram paulatinamente superadas.

 

A Linguagem das Deusas

   

Foram vários os recursos mobilizados por nós, para tentar identificar o tipo ‘bio-psico-social’ de Clarinha durante a sua vida. Compreender, sobremaneira os seus anseios e sentimentos paranormais experienciadas pelo viés dos eternos ‘mitos femininos’, bem como auxiliados pelas janelas do seu inconsciente. Oportunidade de sentir a presença psicológica de um “perfil incomum” que muitas vezes reconhecemos de modo intuitivo em nós ou em alguém a nossa volta e que, por assim dizer, fazem parte do nosso existir.  Despertamos por assim dizer à noção de que as deusas Demeter, Ártemis, Afrodite, Perséfone, Atena e Hera, nos remetem a um simbolismo característico em cada ‘ser humano’ individualmente, membro de grupos e comunidades, cujos perfis psicológicos estão cada vez mais em voga no mundo e no Universo.     

 

Neste refletir sutilezas, através das informações mitológicas da beleza das deusas interior, encontramos uma espécie de guia imaginário, com o qual Clarinha se identificou com os ‘mitos femininos’, que moldam e emolduram a vida das mulheres, durante o percurso das suas existências.

 

Há uma dinâmica fundamental por trás das atitudes de uma mulher como essa que a torna singular enquanto tipo. Parte é adquirida socialmente e parte parece ser inata. Quando a mesma dinâmica psicológica é constatada num grupo de pessoas, temos o que Jung denominou arquétipos. O cientista foi o primeiro a observar que tipos dinâmicos dessa espécie podem ser encontrados em sua forma mais pura na mitologia e na literatura, e que também estão presentes, disfarçados nos sonhos e nas fantasias de todos nós (JENIFER WOLLGER e ROGER WOLLGER, 2007).  

 

Voltando aos momentos de Clarinha, principalmente aqueles de profunda interiorização, ousamos indagar: quanta vez esta jovem sensitiva e paranormal sentiu-se uma deusa? O arquétipo da psicologia humana que está sempre ao lado de qualquer mulher quando reprimida? E, igualmente insegura, desprezada ou negada exteriormente, no contexto da sociedade contemporânea e por que não dizer, da sua inteireza? 

 

Em respostas a essas indagações, os estudiosos do tema, expressam de modo claro as ‘projeções’ dos vários sentimentos das “beldades femininas” quando, no seu mundo interior, identificam-se com as Deusas, os maiores mitos das suas almas. 

 

Nessa concepção mitológica, a mulher Atena regida pela sabedoria milenar busca a realização profissional. Professa pela educação e por uma justiça social repleta de intelectualidade na política. Por sua vez, a mulher Afrodite, ostenta em seu interior a regência do amor nos relacionamentos sexuais e afetivos dos seus romances. A individualidade desta deusa interior costuma ser marcada pelos dons artísticos e a sua grande inspiração surreal a direciona para as artes plásticas.

 

A mulher Deméter, tem fortes atrações pela natureza e gosta de estar grávida. Segundo a mitologia Grega esta deusa é regida pelas colheitas. Costuma envolver-se com os aspectos do nascimento, além de gostar de outras atividades, como amamentar as suas crianças. Diferente de Deméter, a Deusa Ártemis é regida pelas selvas e é considerada a amante mitológica da natureza. Ostenta um temperamento prático e um espírito com características aventureiras. Costuma apreciar a cultura física e segue o curso da sua existência ao ar livre, pois é amante dos animais e identifica-se como a protetora do meio ambiente. Gosta da solidão e igualmente de vivenciar os sentimentos interiores. Em contrapartida a Hera, é a mulher deusa dos céus que gosta de se ocupar com os eventos deste gênero, principalmente aqueles ligados aos cerimoniais do casamento. 

 

A mulher Perséfone foi a Deusa interior com a qual Clarinha se identificou, porque tem fortes ligações com o “mundo avernal.” É mediúnica, visionária, gosta do ocultismo, das experiências místicas. Tem poderes sobrenaturais e reflete os mistérios de outras vidas, principalmente o ‘renascimento’ e admira todas as coisas ligadas à morte e ao corpo físico em sintonia com o cosmo. 

 

Dentre os principais arquétipos gregos da Deusa interior, concluímos que Clarinha elege-se como uma similar de Perséfone. Com todas as características que compõem uma mulher sensitiva e de sentimentos interiores pertinentes. E neste modo de pensar intuitivamente, Woolger e Jennifer, se expressam, ao falar de uma Deusa, que por aproximação, lembra Clarinha, nos ricos detalhes do seu psiquismo:

 

Nos termos da psicologia moderna, diríamos que Perséfone rege a mente inconsciente mais profunda das mulheres, o seu mundo onírico e tudo o que se relaciona com os fenômenos paranormais ou com o misticismo. Portanto, está envolvida com a mediunidade ou canalização (channeling) dos espíritos. Com a capacidade visionária, com os assuntos ligados às áreas da cura mental, abrangidas por certas formas de psicoterapias (WOOLGER, 2007, p.35). 

                                   

O Cientista Humanista do Século XX 

 

Carl Gustav Jung foi um dos fundadores da psicanálise e uma das expressões mais significativas do nosso tempo. As suas idéias se anteciparam aos interesses ‘intelectuais’ e ‘socioculturais’ da nossa atualidade “pós-moderna”. Entretanto os analistas e pensadores pontuam que ele rompeu com Sigmund Freud por causa das divergências psicológicas sobre o conceito da “libido,” desenvolvendo a sua própria teoria e a conceituou como “psicologia analítica”.   

 

O Despertar Interior de um Jovem

 

As pesquisas sobre a psicologia Junguiana nos forneceram dados importantes sobre o vivenciar deste autor. A sua família esteve envolvida com questões religiosas. O seu genitor foi um ser humano com conflitos emocionais complicados e devido à sua filosofia religiosa e práticas de vida, revelava-se um fanático pastor. O espaço domiciliar vibrava numa frequência muito baixa devido à contaminação sutil daquele ambiente circundante. 

 

Como consequência dos conflitos vivenciados pelos seus pais, uma convivência débil se instalou nas relações interpessoais do casal. Estas desavenças domésticas conseguiram deixar na vida do menino prodígio, questionamentos pessoais e existenciais. Um saldo negativo de emanações psíquicas desarmônicas, denominadas por ele como ‘assombrações’ e por causa desses eventos as suas noites cósmicas pareciam pavorosas. Na íntegra umas das revelações do cientista.

 

Meus pais dormiam separados, eu dormia no quarto de meu pai. Da porta que conduzia o quarto de minha mãe vinham influências inquietantes. De noite, minha mãe tornava-se temível e misteriosa. Uma noite vi sair da sua porta uma figura algo luminosa, vaga, cuja cabeça se separou do pescoço e planou no ar, como uma pequena lua. Logo apareceu outra cabeça que também se elevou. Esse fenômeno repetiu-se umas seis ou sete vezes (JUNG, 2006, p.47). 

 

Vale referenciar outros episódios na sua infância quando tinha de dois para três anos, no caso, uma experiência paranormal. As suas lembranças infantis atestam que em certa ocasião ele estava deitado num carrinho de criança, debaixo de uma árvore. Apesar da sua tenra idade, percebeu sinais da natureza circundante em um belo dia de verão, sob um céu azul quente, contemplou a luz dourada do “grande sol central” a iluminar o Universo. Uma percepção sutil que transpassou as folhas da árvore, o atingiu profundamente na sua ingenuidade. A tênue visão despertou-lhe um sentimento introspectivo e o encantou. Atingiu sorrateiramente a sua consciência. E assim se expressa:

 

Estou deitado num carrinho de criança à sombra de uma árvore. É um belo dia de verão quente, céu azul. A luz dourada do sol brinca através da folhagem verde. A capota do carrinho está erguida. Acabo de acordar nesta radiante beleza e sinto um bem-estar indescritível vejo o sol cintilante através das folhas e flores das árvores. Tudo é colorido, esplêndido, magnífico (JUNG, 2006, p.35). 

 

Para esclarecer os nossos leitores sobre o vivenciar do psiquiatra e/ou fundamentar melhor as subjetividades acima referidas, outras fantasias do mundo imaginário consubstanciam a nossa monografia. Naquela época, o pequeno Jung morava numa casa espaçosa e, em anexo, um enorme quintal. Um costumeiro refúgio para exercitar as suas brincadeiras infantis, à sombra dos arvoredos, construindo casas e pontes, com areia molhada. Em suas memórias, Jung relata interessantes vivências que sugerem ter sido ele, uma pessoa ‘especial’ e com características similares às de milhares de outras criaturas deste planeta. Na íntegra a sua visão fenomenológica:    

 

A primeira coisa que se produziu foi o aparecimento de uma lembrança da infância, talvez dos meus 10 a 12 anos. Nessa época eu me entregava apaixonadamente a brinquedos de construção. Lembrei-me com clareza de que edificara casinhas e castelos, com portais e abóbadas, usando garrafas como suportes [...] pedras naturais e terra argilosa como argamassa [...] essa lembrança emergiu acompanhada de certa emoção [...] ‘Ah, ah’, disse a mim mesmo, ‘aqui há vida!’ (JUNG, 2006, p.208).

 

Pelas características do temperamento, acima relacionado, entendemos que existe um mundo ‘imaginário’ em cada um de nós. No entanto, algumas pessoas ‘mais sensíveis’ extrapolam nestas questões e as suas fantasias se tornam mais presentes. Para aquele garoto, esse simbolismo deveria estar passando pelo viés de uma ‘vida criativa’ que lhe fala, mas diante disso, indagava-se a si mesmo: “Mas como chegar a ela? [...] só me restava voltar a ela acolhendo outra vez a criança que então se entregava aos brinquedos infantis” (JUNG, 2006, p.209). 

 

Em um dia qualquer, quando sensivelmente solitário, o pequeno Jung aproveitou os momentos de criatividade para elaborar as suas obras de arte. Esculpiu um homenzinho de seis centímetros de comprimento. O seu fiel escudeiro vestia fraque, cartola e sapatos lustrosos; além de ostentar outros detalhes que o deixaram encantador! Como parte daquela obra de arte, o futuro cientista colou perto daquele amigo um “seixo do remo” (uma pedrinha) muito bem iluminado pelo polimento que lhe fora dispensado. Essa arte criativa ficou durante muito tempo escondida no bolso das calças do garoto. Distante dos olhares dos seus familiares e do público de modo geral. O principal desejo de Jung fora que ninguém tomasse conhecimento daquela mini escultura.

 

Por medida de segurança, Jung deixava-o escondido e adormecido no sótão da sua casa. Contudo, nas suas situações de estresse lá estava ele, aconselhando-se com o seu homenzinho de “mentirinha”. Um pequeno ‘ser’ inanimado idealizado por ele, ora auxiliados pelos conteúdos da sua imaginação infantil.Em seus momentos de iluminadas reflexões Jung tinha propensão a construir obras com argamassas e nessas subjetividades eclodiam as idéias sobre o existir do ser humano. Para as criatividades da sua mente ele as denominou de “relâmpagos” e, num desses eventos, ele as concebeu o caráter da eternidade da sua infância. 

 

Concomitante aos ‘momentos relâmpagos’ o garoto aflorava a criatividade e questionava-se sobre a natureza humana, sobre o existir e animais. O ato imaginário lhe remetia aos inesquecíveis desconfortos. Para suprir estes momentos de subjetividades, recitava de parceria com a mãe uma oração, antes do adormecer. Para ele, essa pequena prece dava-lhe muito conforto e segurança quando pretendia conciliar o seu sono de criança.

 

“Estende tuas duas asas, 

Ó Jesus minha alegria,

E protege teu pintinho,

Se Satã quiser devorá-lo 

Faz cantar os teus anjinhos

“Que esta criança fique ilesa” (JUNG, 2006, p.39).

 

Neste tema de grande poder vibracional Jung, admitia ‘estar seguro’ diante das incertezas noturnas que o assolavam nos braços do anoitecer. Aquela oração simbolizava uma segurança sólida, concreta, no caso a ajuda e apoio divino dos anjos os ‘guardiões’ das noites cósmicas.                     

 

As vivências interiores contribuíram para que Jung se confrontasse com outra realidade, ou seja, o embate com a sua inconsciência. Os conteúdos contidos e/ou reprimidos deixaram marcas indeléveis na sua memória, na sua alma e particularmente no seu existir. 

 

Com o passar do tempo, Jung ficou mais sensível às sutilezas do mundo “avernal”, o espaço dos mortos. Nessa fase, comunicava-se simultaneamente em duas dimensões, uma ‘real’ e a outra ‘supra-real’. Para essas personalidades Jung pontuou como se manifestava nele a personalidade de número 1 e a personalidade de número 2[24]. Segundo Argollo (2004), esta síndrome visceral o tornava ‘dúbio’, ou seja, duas pessoas vivendo em duas dimensões, num clássico fenômeno de “dupla personalidade”. Contudo, de acordo com a visão Junguiana o conceito acima referido significa:  

 

Tinha duas concepções divergentes acerca de mim mesmo: o n.1 encarava minha personalidade e n. 2 como a de um jovem pouco simpático e medianamente dotado, com reinvidicações ambiciosas, um temperamento descontrolado, maneiras duvidosas, ora ingenuamente entusiasta, ora puerilmente decepcionado; no fundo um obscurantista afastado do mundo. O n. 2 considerava o n.1 como aquele que encarnava um dever moral difícil e ingrato, uma espécie de tarefa que deveria ser cumprida de qualquer forma, e que se tornara mais difícil devido a uma série de defeitos: preguiça esporádica, falta de coragem, depressão, entusiasmo inepto por idéias e coisas que ninguém aprecia nas amizades imaginárias, estreiteza de espírito, preconceito, estupidez (matemática!) falta de compreensão com os outros, confusão e desordens no que diz respeito à visão de mundo (JUNG, 2006, p.117-118).     

                                                                                               

De acordo com a conceituação acima referenciada, ficou entendido que a personalidade número 1, é aquela que detecta os defeitos e a auto estima apresenta-se em baixa e negativa, pois ostenta a vulgaridade, a estupidez, a vaidade e o seu amor próprio, torna-se insuportável. Enquanto que a personalidade número 2, detecta as subjetividades, dando livre curso àquilo que irrompe no inconsciente.  

 

Por outro lado, a personalidade número 2 é uma figura subjetiva, típico daquelas pessoas que têm os dons das sutilezas. Cuja compreensão no relacionamento da maioria destas pessoas, fica meio complicado nas suas as formas/pensamento. Enquanto que nas outras pessoas ‘não especiais’ têm outros atributos, são desconectados da sua realidade psicofísica e vivenciam as suas experiências com a predominância do mundo material. Estas pessoas são céticas, desconfiadas em tudo e com todos.

 

De acordo com Jung, personalidade de número 2, só é sentida por algumas pessoas que carregam dentro do seu íntimo, uma voz interior e uma susceptibilidade exacerbada. 

 

No seu livro de memórias, Jung pontua que jamais se desassociou das suas personalidades, porque uma delas, era a mais sutil. A de ‘número 2’, costumava interagir com ele envolvido às suas intuições, inseguranças e medos. Ambas, foram exaustivamente vivenciadas, estudadas e avaliadas, principalmente a de ‘número1’, a mais perturbadora e repleta de exigências.

 

Neste contexto, vale relatar uma das inúmeras experiências de Jung quando descansava na sua pedra filosofal (a pedra misteriosa).Um local escolhido por ele para conversar com as suas duplas personalidades, a respeito da decisão pelos seus exames na Universidade.A personalidade número 1 lutava com a personalidade número 2, por causa da decisão que deveria tomar. E indagava-se: Estudar Historia ou Filosofia? Ou Arqueologia? 

 

Em nossos estudos e pesquisas sobre as aspirações intelectuais de Jung encontramos subsídios imaginários na escolha dos seus objetivos. Algo dos conteúdos dos seus dois sonhos, que lhe forneceram soluções substanciosas para as suas dificuldades existenciais.

 

No primeiro sonho Jung descreve que esteve no Rio Reno e encontrou uma colina que para ele era similar a um túmulo. Cavou a colina e para surpresa sua, encontrou ossos de animais, pré-históricos. No decorrer daquele processo, entendeu que deveria estudar a natureza circundante, com todos os seus mistérios e matizes.

 

No segundo sonho, deparou-se com uma floresta, com o rio, um córrego e bem mais escondido, um açude, em formato circular. No interior daquele açude, percebeu uma espécie de um animal redondo, com a riqueza de pontos coloridos e cintilantes. Composto de inúmeras células e órgãos semelhantes a tentáculo. Para Jung, aquele simbolismo deixou transparecer a idéia de ser um radiolário gigantesco de aproximadamente um metro de diâmetro. De fato, os sonhos, daquele estudante, foram salutares na decisão da sua profissão e, igualmente concluiu que, estava sendo impelido para seguir a trilha das ciências naturais e ocorreu-lhe uma idéia luminosa, a de seguir medicina.

 

A partir desses eventos oníricos, as preocupações do futuro médico, foram indagadas e questionadas no silêncio da sua ‘pedra filosofal. A pedra que o assistia nas suas subjetividades, o símbolo de uma tranquilidade rara, i.é; completamente singular. Com poderes sobrenaturais, aquele ‘talismã’ conseguia ‘içá-lo’ do fundo do poço, no estado depressivo. A sua ‘companheira’ inerte no quintal da sua casa, fora bastante importante para o seu ego, pois naquela pedra, Jung depositava os seus momentos de reflexões e, através do seu vivenciar sutil, cessavam os seus conflitos interiores de forma miraculosa. Consagrava àquela “pedra filosofal” imensos poderes, e assim se expressou em determinado momento da sua vida:

 

“A pedra não sente incerteza alguma, não tem necessidade de exprimir-se, é eterna, vive milênios, pensava. Quanto a mim, pelo contrário, sou fenômeno passageiro consumido por todas as emoções, tal como uma chama que se eleva rápida, e depois se extingue” (JUNG, 2006, p.73) 

 

Diante dessas concepções pelas ‘coisas’ do sagrado, Jung concluiu que ele sempre fora a soma das suas emoções, e a sua ‘pedra intemporal’, era o Outro, nele.

 

Por sua vez, não entendia porque as pessoas nunca estavam atentas aos sinais do Universo. Como mencionados anteriormente, para satisfazer as suas eternas curiosidades, estudou os escritos sobre os espíritos (seres aeriformes), elaborados por Zoellner e Crookes, os cientistas pesquisadores desses fenômenos. No entanto, não entendeu porque ao comentar esses fatos com os seus correligionários, aqueles não lhe deram o devido valor. Reagiram com indiferença, principalmente em relação à existência nas crenças de fantasmas. 

 

No entanto diante dessas considerações dos seus contemporâneos, Jung denominou os fenômenos sutis como “estas possibilidades”, e os considerou extremamente interessantes. Lendo os estudiosos, acima referidos, sentia-se como se a sua existência fosse renovada e que o mundo e o Universo, talvez ganhassem mais e mais profundidade. Entretanto, por não perceber a receptividade do tema pelos seus colegas, compreendeu que jamais falaria sobre o assunto para não ser taxado de ‘louco’! Para ele, os fatos não desapareceriam, porém entendia que a qualquer momento, alguém poderia surgir e falar de modo ‘alto’ e em ‘bom tom’, que compreenderia aqueles significados.

 

E a partir de dezoito anos, os dilemas de Jung foram ficando parcialmente resolvidos com a adição dos estudos de Filosofia em sua vida. Ficou fortemente atraído pelas concepções de Schopenhauer, o pensador que tratou das coisas, da ‘confusão, da paixão e do sofrimento’ (CALVIN S. HALL e VERNON J. NORDBY, 2005).

 

A partir dessa fase acadêmica, Jung transformou-se num empirista, fazendo as suas ‘alquimias’, ou seja, tentando transformar metais pesados em ouro. Diante da suas descobertas científicas ele colocou à disposição da comunidade acadêmica, ‘ferramentas básicas’, para curar as enfermidades do psiquismo humano e/ou do corpo, da alma e do espírito. “[...] Defini-me como sendo um empirista, pois é preciso fazer parte de algo conveniente [...] Como empirista, pelo menos cumpri minha tarefa” (JUNG, 2006, p. 435). 

 

As Marcas Indeléveis da Separação: Jung e Freud

   

O psicanalista Sigmund Freud foi considerado por Jung um dos seus melhores amigos, uma “pseudo-amizade” no campo da ciência. Entretanto devido às contradições nas concepções da riqueza do psiquismo humano a convivência amigável dos cientistas ficou terminantemente comprometida.  

 

Na visão de Freud, o inconsciente é criado pela repressão e este é um processo pessoal derivado da experiência vivida. Na visão de Jung, ele tem uma base coletiva, o que significa dizer que o inconsciente possui estruturas inatas que influenciam em muito e talvez determinem seu conteúdo (POLLY YOUNG e EISENDRATH TERENCE DAWSON, 2002, p.28).

 

De acordo com os nossos estudos sobre a teoria analítica, ficou entendido que o primeiro contato entre os dois durou cerca de 3 horas ininterruptas. Aquele empirista, o percebeu como um ser humano dotado de vários dons, inteligente, penetrante e notável. As primeiras impressões sobre a intelectualidade do psicanalista foram marcantes, pois a sua teoria sexual o impressionou, porém com o decorrer do tempo a relação daqueles dois amigos entrou no processo de fragilização em consequência das divergências dos conceitos da psicologia de modo geral.

 

Divergências em relação à teoria sexual, sonhos, fantasias e os conceitos de inconsciente. Por mais que Jung ‘mostrasse’ a Freud, seus argumentos em relação àqueles seus conceitos, este, o contestava peremptoriamente. Cada argumento de Freud tinha um peso importante na sua teoria, tanto do ponto de vista pessoal quanto filosófico. Freud desconfiava dos conceitos do amigo e recorria à sua tese, ou seja, à hipótese da sexualidade recalcada ou a psicossexualidade, pois ambos tinham idéias divergentes no campo da ciência. As atitudes de Freud estavam ligadas aos seus preconceitos subjetivos, ou até que ponto repousava vivências objetivamente demonstráveis. Avaliando essas evidências Jung assim se expressa: 

  

Objetei que, logicamente, levada às últimas consequências, suas hipóteses conduziam a raciocínios que destruíam toda a civilização: esta tomava aparência de uma simples farsa, consequência mórbida do recalque sexual. ‘Sim’, confirmava ele, ‘é assim mesmo. É uma maldição do destino em face da qual somos impotentes’ [...] não me sentia, porém, a altura para discutir com ele (JUNG, 2006, p.184).

 

A partir dessas divergências, a solução encontrada por Jung seria romper com Freud. O rompimento daquela relação de aproximadamente sete anos deixou marcas indeléveis no seu existir como psiquiatra, e estudioso dos fenômenos subjetivos. Um rompimento que gerou momentos de incertezas e que deixou marcas indeléveis no seu existir.

 

Em certa ocasião, Jung comentou consigo mesmo que se sentia “flutuando”! E, que a partir daquela relação não encontrara mais a sua própria posição como cientista. A solução mais viável foi acreditar e confiar incondicionalmente nos conteúdos guardados no inconsciente da sua clientela, e nos ‘experimentos-chaves’ naquilo que partia deles. Da escuta amorosa e do que o acaso pudesse lhe oferecer em relação aos sonhos, fantasias e outros questionamentos recheados pela subjetividade humana. A sua postura refletia uma nova atitude em relação aos atendimentos dos seus pacientes, logo lhe surgiam às idéias de partir para interpretar os sonhos dos seus pacientes, sob tratamentos terapêuticos.

 

Dando seguimento aos nossos estudos sobre a teoria de profundidade, encontramos nos escritos de Silveira (2001) vasto material no que diz respeito aos sonhos que, de acordo com ela, os sonhos não aceitam disfarces e nem admitem traduções de desejos. Uma concepção diferenciada de Freud quando conceituou que os sonhos e as subjetividades se restringem apenas à realização disfarçada dos desejos reprimidos. Uma contradição às concepções Junguianas a de que o material onírico é o ponto de partida e a base fundamental para a criação da sua psicologia de profundidade.

 

Diante destas considerações, entendemos que Jung percebeu de modo diferente os processos oníricos diante às inúmeras indagações da sua clientela. E intuiu que havia encontrado a chave para abrir as janelas da alma humana e alcançar a meta da sua tese analítica. E sabiamente externa à humanidade a sua concepção.                     

 

Possuo agora a chave para a mitologia e poderei abrir todas as portas da psique humana inconsciente. Ouvi, então, uma voz murmurar dentro de mim. Por que abrir todas as portas? E logo emergiu a interrogação sobre o que já havia realizado. Eu esclarecera os mitos dos povos do passado, escrevera um livro sobre o herói, este mito em que o homem sempre viveu. ‘Mas em que mito vive o homem de nossos dias’? No mito cristão poder-se-ia dizer. Por acaso vives nele? Algo perguntou em  mim. Mas qual é o mito para ti o mito para no qual vives? Senti-me cada vez menos à vontade e parei de pensar. Atingira um limite (JUNG, 2006, p.205-206).

 

Dos Acordes Iniciais à Psicologia Analítica

 

Para conseguir alcançar a meta de construir a psicologia analítica, Jung experimentou-se como ‘um modelo’, longe de ‘formalismos’ e ‘medições’ previamente estabelecidos pelas teorias do conhecimento. Entretanto, ainda não sabia que certos acontecimentos da sua vida, escapavam às limitações de ‘espaço’, ‘tempo’ e ‘causalidade. Todavia, buscou o ‘autoconhecimento’ e a ‘individuação’, ao descrever suas percepções sensoriais como elas se apresentavam, sem servir-se de uma terminologia científica ou considerar-se como um ‘problema científico. ’

 

Concebeu que as suas experiências atingiam os porões do seu inconsciente, de ‘si mesmo’ e da humanidade como um todo. Com uma visão científica, positiva e profunda, entendeu que estaria entrando num processo extremamente difícil ao reconhecer que a sua atitude não seria uma tarefa fácil.

 

Jung descreveu a sua forma individual de ‘ver’ e ‘perceber’ o existir de um ser humano, em vários estágios, ou seja, dentro do contexto da totalidade máxima, segundo as leis universais, baseando-se no amor ao próximo e na sabedoria divina.

 

Neste seu caminhar sutil, constatou, em suas teorias, que os fenômenos paranormais poderiam ser reais e curados na vida de um ‘ser pensante’, trabalhando-se os conteúdos guardados no inconsciente. Exercendo práticas terapêuticas através dos métodos experimentais, utilizandoos com rigor, sempre abertos ao novo, ao comum e ao inesperado. Quando o se indagava a si mesmo sobre os critérios da lógica e da comprovação da sua obra expressava-se:

 

“Foram estes os conhecimentos decisivos da minha vida. Começava compreender: era responsável e de mim dependia o curso do meu destino. Um problema me havia sido proposto e a ele eu devia responder” (JUNG, 2006, p.78).

 

O resultado destas ações representou para o cientista, os ‘primeiros acordes’ da formulação da sua teoria profunda. Demonstraram serem elas a inspiração divina que consubstanciava a sua atitude científica e competência intelectual. O verdadeiro poder de uma força mental, criativa e bastante acentuada. Como uma resultante do seu poder interior e de uma mente sadia, livre de toda e qualquer atestado de senilidade mental.

 

Somado à sua visão científica, o psiquiatra descreve em suas memórias os seus fieis depoimentos sobre os eventos que fizeram parte da sua vida interior, no limiar da consciência e do inconsciente. Neste caso, Jung se superou. Foram firmes as suas experiências no decorrer dos seus dias. E esse vivenciar sutilezas transformou-se na mais importante teoria analítica. A Psicologia que foi baseada na riqueza do psiquismo humano para depois, se transformar na teoria de profundidade dos nossos dias.

 

Enquanto caminhávamos na direção dos ensinamentos de Jung, ficou entendido que as críticas sofridas por ele, ao elaborar a sua teoria analítica, não abateram o seu ânimo Quanto às críticas direcionados à Clarinha por causa das suas subjetividades exacerbadas, entendemos que ela jamais se deixou abater ou “embriagar-se” por elas. De parceria conosco, enfrentamos os desafios dos problemas e dificuldades que a fenomenologia paranormal acarreta aos seus portadores tomando por base atitudes sábias ao enfrentar as críticas ‘disfarçadas’ dos seus pares. Diante deste caminhar rico de sutilezas, inserimos na íntegra dos textos, o vivenciar do cientista quando elaborou a sua teoria  profunda, uma ciência direcionada ao ser humano e a sua existência pelos  caminhos da transformação.Na íntegra, os depoimentos de estudiosos desta teoria analítica:

 

Em nível pessoal, ele foi acusado de misticismo sectário, sexismo, racismo, antisemitismo e má conduta profissional. Em relações às suas idéias, seus críticos têm repetidamente insistido que sua abordagem é pouco clara antiquada e enraizada em categorias tendenciosas, tais como ‘masculino’ e ‘feminino’ e conceitos vagos como ‘sombra’ e ‘sábio Ancião’ (YOUNG e DAWSON, 2002, p.1).

 

Contudo, para nós e para Clarinha, não importa essas polêmicas sobre a teoria de Jung, o mais importante é que, estes escritos têm surtido grandes efeitos na vida dela e nas mentes daquelas pessoas que passam experiências semelhantes às dela e, as do cientista de Zurique. Independentemente do que Jung possa ser, ou do que foi as suas ações contribuíram exaustivamente para a evolução da ciência. Conceitos importantes que devem ser contemplados como um potencial de alto nível acadêmico para a área do psiquismo humano. Um verdadeiro bálsamo para a cura das percepções sutis do ser humano, enquanto espírito mente e corpo físico.

 

De acordo com os analistas e pensadores Young e Dawson (2002) as idéias de Jung oferecem contribuições mais notáveis e influentes ao século XXI. Reconhecem que essa teoria profunda tem como base científica um modo valioso de decifrar os problemas e desafios que nos confrontam individualmente, como membro de grupos e comunidades. Uma ciência que nos permite entrar nos múltiplos níveis da realidade psicofísica, cujas idéias têm tido influências marcantes nas disciplinas, a partir da antropologia, estudos religiosos à crítica literária. A teoria de profundidade nos proporciona ao longo da história, contribuições importantes aos destinos psicológicos da humanidade. 

 

Os conceitos científicos da teoria analítica têm sido inseridos nas pesquisas acadêmicas da Antropologia, estudos religiosos às práticas alternativas orientais e ocidentais, as quais foram sabiamente utilizadas por ele, enquanto no tratamento dos seus pacientes. Através desta corrente de pensamentos, ficou patente que o cientista reconheceu no ser humano a ‘totalidade máxima’.Compreendeu a riqueza do seu psiquismo e cuidou das suas devidas concessões, adaptando o seu método cientifico às peculiaridades de cada caso clínico. 

 

Legado de Jung

 

Somos unânimes a direcionar um foco mental para avaliar este legado que Jung deixou para os acadêmicos, e consequentemente para toda a humanidade. A sua psicologia analítica considera o ser humano como uma ‘totalidade’ e a ‘psique’ como uma ‘interação de fenômenos intrapsíquicos, somáticos e interpessoais’.

 

Dentro deste contexto se expressa Sherry Salman (apud YOUNG e DAWSON, 2002, p.6970), enfatizando a psique criativa do ser humano como uma das principais contribuições do cientista em pleno século XXI. 

 

Para Jung a psique era uma coisa maravilhosa; fluida, multidimensional, viva e capaz de desenvolvimento criativo [...] estava familiarizado com a doença, com a psicose e com a inércia. Mas o seu amor pelo caos ordenado da psique e a confiança em sua integridade informaram sua concepção dela e moldaram sua visão psicanalista. Embora o cientista tenha sido malvisto por ter utilizado fontes esotéricas na criação da sua teoria profunda (alquimia medieval), ele estava à frente do seu tempo. O importante da visão Junguiana é que ela ofereceu à humanidade uma importante contribuição à ‘desconstrução’ pós-moderna da dicotomia ‘sujeitoobjeto’. 

 

Diante dessas considerações sobre os feitos e ações do cientista de Zurique, os estudiosos abaixo relacionados, enfatizam: O conceito da psique sustenta a idéia primordial de Jung de que uma pessoa, em primeiro lugar, é um todo. Não uma reunião de partes, cada uma das quais foi sendo acrescida pela experiência [...] O homem não luta para se tornar um todo: ele já é um todo, ele nasce como um todo (HALL e NORDBY, 2005, p.25).  

 

Por outro lado Jung pontuou que, o centro regulador mais profundo da psique chama-se ‘Self,’ o que significa dizer, que mantém o equilíbrio psicológico de um ‘ser pensante,’ como parte integrante do cosmo, e consequentemente da totalidade .Então no âmago do nosso ‘ser’ está configurado, de modo latente, todos os nossos desejos pelas buscas.Aqueles desejos alimentados pelas miríades da Alma,  que ‘dá vida’ e que faz ‘mover’, o nosso ‘eu superior’.Na íntegra, a concepção do cientista:

 

Cada vida é um desencadeamento psíquico que não se pode dominar a não ser parcialmente. Por conseguinte é muito difícil estabelecer um julgamento definitivo sobre si mesmo ou sobre a própria vida. Caso contrário, conheceríamos tudo sobre o assunto, o que seria totalmente impossível. A história de uma vida começa num dado lugar, num ponto qualquer de que se guardou a lembrança, e já, então, tudo era extremamente complicado [...] Tudo o que conheço, mas não penso num dado momento, tudo aquilo de que já tive consciência, mas esqueci tudo o que foi percebido por meus sentidos e meu espírito consciente não registrou tudo que involuntariamente sem prestar atenção (isto é, inconscientemente), sinto, penso, relembro, desejo e faço todo o futuro que se prepara em mim e que só mais tarde se tornará consciente, tudo isso é conteúdo do inconsciente (JUNG, 2006, p.32-488).

  

Estudando a teoria Junguiana, e sem perder de vista a ‘individualidade, o‘fortalecimento do ego’ e o foco pelo ‘autoconhecimento’, encontramos outro conceito elaborado pelo psiquiatra que difere do conceito do consciente individual, o do ‘inconsciente coletivo’. Aquele conceito, cujos conteúdos inconscientes, estão afetos a todo ser humano e consequentemente a toda a humanidade, as memórias ancestrais herdadas dos nossos antepassados (JUNG, 2006).

 

De conformidade com a sua teoria, os conteúdos do inconsciente coletivo denominam-se ‘arquétipos’, um sentimento original’, um ‘existir’ remoto. Como sinônimo de arquétipos, temos ‘protótipo’. Por ocasião das nossas pesquisas, encontramos os vários exemplos de arquétipos pontuados pelo cientista após longos dias de pesquisas, a saber: do ‘nascimento’, do ‘renascimento, da ‘morte,’ do ‘poder’, ‘da magia’, ‘do herói’, ‘da criança’, ‘do embusteiro’, ‘de Deus’, do ‘demônio,’ do ‘velho sábio’, da ‘mãe terra’, do ‘gigante ’e de outros gêneros psicológicos.

 

Durantes as nossas exaustivas pesquisas, na tentativa de compreender o vivenciar sutil de Clarainha, compreendemos que o cientista, deixou conceitos de extrema sabedoria para a humanidade, a herança do psiquismo dos nossos irmãos mais velhos. E se expressa cientificamente: 

 

O arquétipo em si mesmo é vazio é um elemento puramente formal [...] É impossível provar a existência dos arquétipos, ou dos instintos, a não ser que eles mesmos se manifestem de maneira concreta [...] deriva da observação reiterada de que os mitos e os contos da literatura universal encerram temas bem definidos que reaparecem sempre e por toda parte [...] A essas imagens e correspondências típicas, denomino de representações arquetípicas (JUNG, 2006, p.31-485).

  

Este conceito é pontuado por Jung, como “mitos” e/ou contos literários universais que estão sempre presentes na vida do ser humano e costumam aparecer em toda parte, independente de cor, religiosidade e nações. Manifestam-se nos “sonhos, nas fantasias ou nas idéias delirantes”. Os arquétipos são, por assim dizer, as manifestações que surgem no existir humano através dos símbolos.

 

Dentro das conceituações Junguianas, encontramos definições importantes, que consubstanciaram os nossos questionamentos e indagações, sobre as subjetividades das pessoas ‘especiais’, principalmente daquelas dotadas de um ‘perfil incomum’. Neste vivenciar sutilezas vale refletir como o cientista se refere em relação ao tema.   

                

“O que chamamos de símbolo é um termo, um nome ou mesmo uma imagem que nos pode ser familiar na vida diária, embora possua conotações especiais além do seu significado evidente e convencional” (JUNG, 1964, p.20). 

   

De acordo com as concepções referenciadas ficou compreendido que o ser humano, ao longo da sua história, utiliza a ‘palavra escrita ou falada’, para se comunicar com os seus pares. Esses simbolismos representam os ‘sinais’ de suma importância no interagir da humanidade como um todo. São os modelos universais que nos colocam diante das ‘crenças’, dos ‘costumes’ e ‘ideologias’, recheados de ‘imagens e sinais’ não estritamente descritivos, todavia com uma série de ‘siglas’ para que a sociedade possa se comunicar com as instituições públicas e privadas do mundo. 

 

No interagir dessas ações encontramos os exemplos simbólicos, ou seja, as siglas do INAMPS, da UNESCO, do UNICEF e dentre outros. Para Jung (1964), essas ‘palavras e imagens’ representam um simbolismo que, contribuíram e implicaram coisas, além do seu significado manifesto e imediato. São imagens com aspectos inconscientes amplos, porém muitas vezes indefinidos ou mal explicados. 

 

Em sua autobiografia encontramos revelações surpreendentes de Jung (2006) quando atendia os seus pacientes, utilizando-se da ‘linguagem simbólica’. Aquela linguagem apreendida em seus estudos e pesquisas e que esteve sempre presente nas suas ‘experiências de associações’.

Nestes aspectos, ele pontuou a sua versão sobre o conceito simbólico no existir humano:    

 

Encadeamento de idéias, de percepções etc., segundo a semelhança, conexão e oposição. Associações livres na interpretação de sonhos de S. Freud; cadeias de associações espontâneas do sonhador, que se relacionem necessariamente com a situação onírica. Associações dirigidas ou controladas na interpretação Junguianas dos sonhos: idéias espontâneas cujo ponto de partida é a situação onírica dada, e que sempre se relacionam com ela (JUNG, 2006, p.486).

 

No próximo capítulo, tentaremos fazer algumas ligações simbólicas no interagir das relações humanas. Também discorrer sobre outras concepções do cientista que dão ênfase aos fenômenos baseados nas leis naturais e do princípio da causalidade. Aqueles princípios ligados pelo mesmo significado para a difícil descrição da realidade. Eventos que exprimem coincidências ou uma correspondência entre um acontecimento psíquico e um acontecimento físico não ligado por uma relação causal:

  

Tais fenômenos de sincronicidade aparecem, por exemplo, quando fenômenos interiores (sonhos, visões, premonições) parecem ter uma correspondência na realidade exterior: a imagem interior ou a premonição mostrou-se ‘verdadeira’ [...] entre sonhos, idéias análogas ou idênticas que ocorrem em lugares diferentes, sem que a causalidade possa explicar umas e outras manifestações. Ambas parecem ter relação com o processo arquetípico do inconsciente (JUNG, 2006, p.494). 

                                                                                                                                                                             

Além dos efeitos sincronísticos, uma chave importante na busca da compreensão da natureza humana, foram encontramos nas cartas do Tarô. Um simbolismo que funcionam como ‘ferramentas’ básicas para se inteirar daquilo que se passa no psiquismo do ser pensante. Jung valorizou em sua teoria todos os caminhos não racionais (Tarô) e isso se explica também pelo seu interesse pela astrologia. E assim se expressa a sua ex-discípula:           

 

Uma viagem pelas cartas do Tarô, primeiro que tudo é uma viagem às nossas próprias profundezas. O que quer que encontrem ao longo do caminho é, au fond, um aspecto do nosso mais profundo e elevado eu [...] erupções dramáticas desse gênero usualmente significam que aspectos negligenciados de nós mesmos buscam reconhecimento. Como as figuras dos nossos sonhos, sem dúvida, as personalidades do Tarô introduziram-se em nossa auto-satisfação a fim de trazer-nos mensagens de grande importância: mas o homem moderno, imerso como está numa cultura verbal, acha a linguagem pictórica não-verbal do Tarô difícil de decifrar (SALLIE NICHOLIS, 2007, p.18).

 

Compreende-se que, na teoria Junguiana o Tarô é considerado um dos Oráculos rico de significados, porque nos seus simbolismos estão presentes na janela do pensamento inconsciente. Cada carta manuseada pelo tarólogo tem por base, importantes imagens arquetípicas, cujos significados nem sempre são reconhecidos pelo homem moderno. Jung concebeu nessas cartas as imagens e informações da ‘psique e da alma humana’ no processo das suas origens e finalidades nas diversas formas do ‘existir’.

 

Nichols (2007) relata em seus escritos que durante várias décadas praticou a terapia Oracular em seus pacientes como alternativas auxiliares do principio de ‘individuação’, para a identificação dos ‘arquétipos’, da ‘sicronicidade’ e da ‘imaginação ativa’. Representações terapêuticas na cura do ser humanas rumo à transformação e à integração do ‘Si-mesmo’.

 

“O ‘Si-mesmo’, é o centro e também a circunferência completa que compreende ao mesmo tempo o consciente e o inconsciente: é o centro dessa totalidade, como o eu é o centro da consciência” (JUNG, 2006, p.494). 

 

Então se compreende que a psicologia analítica tem como finalidade única acender uma luz na escuridão da alma do ser humano, ‘ individuá-lo’ e ‘fortalecer o seu ego’, enfim, conduzilo à cura, auxiliadas pelas técnicas alternativas. Nesta concepção ficou evidente a subjetividade do psiquiatra ao refletir a sua própria existência que se resume nesta frase: “Minha vida é a história de um inconsciente que se realizou” (JUNG, 2006, p.31).

  

Similaridades ou Identificação?

      

Quando decidimos pesquisar as PES de Clarinha alguns estudiosos do tema sugeriram bibliografias sobre Psicologia Analítica propriamente dita e Realidade Psicofísica.  Entretanto, estudando estas teorias encontramos respostas compatíveis com as nossas indagações relacionadas ao perfil psicológico da amiga, objeto da nossa análise. No decorrer dos textos, acreditamos que, alguns leitores chegarão também às suas conclusões, em relação a tudo aquilo que Jung vivenciou em si, e em seus pacientes. A apresentação deste material subjetivo sintetiza o desejo das aspirações acima referenciadas.

 

Neste ínteri, Clarinha coloca-se diante de nós, como uma ‘sensitiva’ disposta a teorizar as suas sutilezas e fazer delas, a comparação com as vivencias de Jung. Esta sua postura reflete o grau de seu amadurecimento espiritual ao se expressar como “um modelo”. Fazer dos seus eventos, “experimentos-chaves” para chegar à legitimação de uma paranormalidade perante a ciência. Como seguidora de Jung, ela reflete com os sentimentos de uma pálida certeza, de que se o cientista fisicamente ainda habitasse este planeta consideraria “essas possibilidades” e, igualmente, legitimava as suas subjetividades. 

 

A busca de Clarinha pelo entendimento passou pelo viés da identificação. Identificar-se com o outro é torna-se parecido, é sentir-se ou tornar-se um modelo do outro. Por essas razões é que Clarinha atesta que os escritos de Jung, são relatos fies que o ‘mundo’ acadêmico e contemporâneo precisam entender e conceber.

 

A identificação de Clarinha com Jung ocorreu quando viajávamos nas páginas da psicologia analítica. Estes escritos despertaram também, em nós, um profundo interesse devido às similaridades dos seus eventos com os de Jung. Estabelecer analogias significa pretender objetivamente delinear o grau de influências e semelhanças das subjetividades da amiga com aquelas que o cientista vivenciou a partir da sua primeira infância. Como amiga e confidente de Clarinha, entendemos que os fatos vivenciados por Jung fazem sentido na vida dela e ocorrem também no seu ‘habitat emocional’ e ‘espiritual’, para os quais, já está habituada.

  

Cada mergulho na teoria profunda nos possibilitou perceber e compreender’ nas subjetividades de Jung uma espécie de base intelectual e sensorial às vivências interiores de Clarinha dentro do seu processo paranormal. Por outro lado, ainda percebemos que, como ela, poderia integrar ou relacionar o seu ‘ser físico’ à sua vivência metafísica, uma situação que se faz presente na vida de pessoas ‘especiais’ ou ‘sensitivas’.

 

No processo de encontrar respostas aos seus questionamentos dentro da teoria Junguiana, a amiga não pode disfarçar as lágrimas ao identificar-se com o cientista e o escolheu como ‘modelo’ para o seu vivenciar sutil. 

 

Aprofundando as nossas pesquisas sobre a teoria analítica e igualmente analisando a relação entre estas duas figuras humanas, compreendemos que os fundamentos e conceitos Junguianos desvendam segredos e mistérios de uma fenomenologia paranormal, bem como amenizam os efeitos negativos sobre os seus corpos físicos e extra-físicos. Na íntegra um dos textos escritos por Clarinha que relatam as suas concepções sobre o criador da psicologia analítica: 

 

Quando pesquiso as teorias do cientista, eu tenho a consciência que ele deixou para a humanidade inteira e aos sensitivos, conceitos e momentos de reflexões sobre a fenomenologia paranormal. Dotado de uma sensibilidade incomum ele se expôs desejoso ‘poder-ser’ o perfil de um modelo para outras gerações, que como ele, vivenciou uma fenomenologia testando-a em si mesmo e principalmente na sua clientela em Zurique (CLARINHA, 2007, p.34).

 

Neste caminhar sutil, Clarinha sente-se altamente fortalecida e completa na sua individualidade, integridade física, moral e mental para vivenciar as suas dificuldades graças à ‘individuação’ e a fé que deposita no Poder Absoluto. O sentimento de autoconfiança a faz sentir-se poderosa para os desafios que a vida lhe oferece. Nas dificuldades, nas surpresas e no enfrentamento dos mistérios que ainda estão por vir. Acrescente-se a este fato, o seu processo de aprendizado espiritual que, de certa forma, contribuiu para sentir-se confortada pelo sentimento de que tudo daria certo. 

 

Diante de tantas sutilezas e ‘similaridades’ com Jung, coube a nós, fazer as seguintes indagações: Há alguma similaridade nas personalidades e vivências sutis dessas duas criaturas? Será que Clarinha foi a ‘escolhida’ pelo Universo para voltar a levantar essas questões sobre o empirismo sutil e tomado de decisões da ciência sobre a insistência e/ou legitimação das PES?

 

A partir dos nossos estudos sobre as vivencias de Jung, da sua forma de encarar a vida, a natureza, as plantas e aos animais, descobrimos várias semelhanças e/ou coincidências do perfil do cientista com o perfil de Clarinha. A começar pela infância. Ambos tinham a inclinação para construir casas e pontes no quintal de suas casas, Clarinha, no Piauí e Jung na Suíça. As brincadeiras e tarefas infantis foram o refúgio para os seus mundos ‘imaginários’. Momentos para os quais, vinham à tona os sentimentos de uma ‘imaginação criativa’, que posteriormente foi inserida na teoria Junguiana como ‘técnica a ser aplicada por terapeutas, no processo de individuação de pacientes para aflorar sentimentos interiores em busca de cura.

 

Em determinadas fases das suas vidas, ambos experimentavam as sutilezas das noites cósmicas com grandes dificuldades e inseguranças. Vivenciava os ‘pavores noturnos’ o que se tornava necessário recitar aquelas preces divinas antes de adormeceram. Em suas memórias, Jung se refere a essas orações como ‘veículos’ de proteção espiritual. Enquanto crianças sensitivas estes paranormais sentiam naquelas orações sentimentos de segurança e conforto espiritual, diante das ambiguidades das noites cósmicas. Aquelas preces ou poemas divinos, enquanto recitados por estes sensitivos, nos deram a impressão de que assim procedendo fortaleciam o psiquismo infantil, representando um simbolismo do apoio para um alongamento das suas existências. Não somente para Clarinha, mas para Jung, o Senhor Jesus, representava significados sobrenaturais e, enquanto crianças viam naquela mensagem de amor a figura de um ser afável, protetor e benevolente. 

 

No decorrer das nossas pesquisas, sobre as subjetividades dos dois sensitivos, compreendemos que, ambos, possuíam objetos com funções similares para dar vazão às subjetividades. Clarinha tinha  o livreto de sonhos e  Jung, a ‘pedra filosofal’. 

 

Como amiga e confidente desta sensitiva, percebemos nas similaridades dela, algo semelhante com o vivenciar sutil do cientista quando criança como, por exemplo, nos sonhos recorrentes, premonições e outros eventos do gênero. Percebemos também que, com o passar dos anos, a sensibilidade de ambos tornava-se mais aflorada. Em suas memórias encontramos um fato bastante interessante que ocorreu com Jung, que é rico de veracidade. 

  

Por volta do outono de 1913, a pressão que até então sentira pareceu deslocar-se para o exterior, como se algo pairasse no ar [...] a atmosfera parecia-me mais sombria do que antes. Não parecia tratar-se de uma situação psíquica, mas de uma realidade concreta. Esta impressão tornava-se mais intensa. [...] viajando sozinho fui subitamente tomado de uma visão: vi uma onda colossal cobrir todos os países da planície setentrional, situados entre o mar do norte e os Alpes [...] acabara de ocorrer uma espantosa catástrofe [...] O mar transformou-se em torrentes de sangue. Esta visão durou cerca de uma hora, perturbado, nauseado, tive vergonha de minha franqueza [...] Uma voz interior me disse: ‘Olha bem, isto é real e será assim, portanto não duvides’(JUNG, 2006, p.210).       

 

De acordo com o relato do cientista acima referido constatamos que se trata de uma premonição através de sonhos recorrentes, pois o cientista sonhou varias vezes sobre este acidente em 1914. E no primeiro dia de Agosto, deste ano, estourou a Primeira Guerra Mundial. Fenômeno idêntico ocorreu com Clarinha, ao detectar na vida de uma amiga, um problema judicial que acarretou dificuldades financeiras. Meses depois, esta mesma amiga, comentou com ela que fora despejada da residência sob uma ação judicial.

 

Em relação a estes mistérios da consciência humana o sensitivo e terapeuta Argollo (2004), pontuou em sua obra sobre as características da capacidade mediúnica do ser humano, visto que ela está ligada ou radicada no sistema nervoso como áreas ou área cerebral específica. Daí concluirmos que no caso de Jung versus Clarinha, entende-se que essas duas criaturas de Deus, tenham renascido com essas áreas sensíveis, às quais, não poderiam ser exercidas de outro modo a não ser levando em consideração uma carga genética. No caso Jung complementa o terapeuta, essas subjetividades tiveram uma carga genética, herdada de sua mãe. Enquanto que, a de Clarinha, foi originária de sua prima Bel.                          

 

Como já nos referimos anteriormente, nossa amiga tem um modo todo especial de documentar os seus sonhos. Segundo ela, registrar os seus sonhos e visões faz parte do seu ritual diário para se livrar-se dos problemas e dificuldades sutis da sua vida ou do seu do diaa-dia. Documentar sutilezas faz bem e exercem efeitos curativos no existir do ser humano em estados subjetivos aflorados. Na infância Clarinha tinha como mentor espiritual o Índio Tupi e Jung, Filemon, uma entidade pagã e misteriosa que inspirava uma atmosfera meio-egípcia. 

 

Sob a vibração do Índio Tupi, Clarinha desenhava ‘círculos de cura’ que se assemelhavam às mandalas de Jung, cuja definição encontra-se na íntegra destes textos:

                                             

Mandala (sânscrito) - círculo mágico [...] símbolo do centro, da meta e do si - mesmo enquanto totalidade psíquica; auto-representação de um processo psíquico de centralização da personalidade de produção de um centro novo desta última [...] exprime-se, simbolicamente, por um círculo, um quadrado ou um quaternio [...] (JUNG, 2006, p.490).

 

Certa vez, estudando as duplas personalidades e 2 do cientista, a própria Clarinha se surpreende ao tomar conhecimento de que como ele, é portadora de duas personalidades, sem, todavia, dissocia-se da sua realidade psicofísica.Quando em sintonia com uma delas, a de número 1, por exemplo, as suas ações normais são dirigidas por um dinamismo incomum e se faz presente em todos os atos da sua existência. Enquanto que sob os efeitos da segunda a de número 2, a amiga dá lugar a tudo aquilo que irrompe no seu psiquismo. 

 

E se expressa em seu Diário particular (2002, p.5): “Eu costumo estar simultaneamente no ‘aqui e agora’ e em outras demissões, sem, todavia, perder o prumo da minha realidade psicofísica” De acordo com esta concepção, Clarinha detém este poder de interagir no Universo circundante mediante as ações da sua dupla personalidade. 

 

Deste modo, Clarinha confessa que seguindo as orientações sugeridas pelo mestre da teoria profunda, passou a se questionar também com relação à sua personalidade de número 2. Segundo ela, as pesquisas sobre as personalidades de Jung a fizeram entender que também estaria diante de um problema, porém, não ‘sabia’ entender que, jamais poderia se libertar dele, e fugir jamais. Compreendeu que a paranormalidade entrou na sua vida sorrateiramente e deixou marcas indeléveis dentro do seu ser. E de modo consciente se identifica com Jung em todos os seus momentos, desejos, aspirações, pelas ‘coisas do sobrenatural e, igualmente do psiquismo humano. Como o cientista, Clarinha nos declara que, em certas ocasiões do seu existir, entende-se como totalidade dentro dos processos das suas subjetividades.  

 

Neste clima de seguir as orientações da teoria de profundidade, Clarinha admite não revelar às pessoas fora do seu grupo ‘especial’ a existência de eventos paranormais, para os quais ele denominou “estas possibilidades”. Entendeu porque é advertida pelos umbrais da espiritualidade a não fazer revelações sutis sobre o existir destes fenômenos, isto é, sem apresentar fatos reais, pois estes conteúdos são inexplicáveis, e até para o cientista soaram como ‘complicados’.  

 

Chamamos atenção para os momentos depressivos dos dois sensitivos aqueles instantes sutis nos quais nada é necessariamente belo ou ruim; ou quando nada acontece e nada flui. Um sentimento de totalidade múltipla, indefinida, inquestionável, tal qual uma queda de sintonia vibracional nas profundas dimensões de um vazio no espaço cósmico.   

 

Diante dos fatos referenciados na íntegra deste capítulo, máxima a conclusão a que chegamos: As duas criaturas revelam uma relação íntima com a natureza. Ambos têm interesses pelas coisas do sagrado, subjetividades exacerbadas, e são dotados de poderes sobrenaturais. Sem se deixar enlevar pelos mistérios da natureza Jung e Clarinha revelaram o gosto pelas altas montanhas, rios, lagos, árvores, flores e mistérios do firmamento, o cenário que para eles traduzem fielmente as suas essências divinas. Como Jung, a nossa amiga, das artes plásticas é intuitiva, paranormal, mística e tem fortes ligações com o mundo “avernal” e com os mistérios do sobrenatural que envolvem o espírito, a mente e o corpo físico. 

 

Nas percepções extra-sensoriais de Clarinha encontramos material suficiente que a torna ‘idêntica’ em suas percepções extras sensoriais com Jung. Deste modo encerramos este capítulo com uma frase significativa diante destas duas criaturas de Deus: “[...], pois foram esses momentos as experiências através das quais o ‘mundo eterno irrompeu no mundo efêmero’ (JUNG, 2006, p.32). 

 

Segundo Jung, foram esses os momentos mais importantes da sua vida. Momentos superiores às viagens, relações humanas e outros derivativos do gênero. Compreendemos que como Jung, Clarinha continua vivenciando estes episódios e conseguiu através deles o confronto com o seu inconsciente, sem se deixar ‘abater’ ou ‘sabotar’ por ele[25].

 

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