sutilezas do existir

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monografia

UM CASO DE PARANORMALIDADE SOB A ÓTICA DA PSICOLOGIA JUNGUIANA

4. INTERPRETANDO VIVÊNCIAS PESSOAIS

 

No capítulo anterior, registramos algumas percepções extras sensoriais de Clarinha nas mais diversas formas de encarar a vida nos seus relacionamentos com o mundo e com o universo. Porquanto neste, transcreveremos as várias concepções de pensadores e estudiosos do mundo dos sonhos, a partir da visão científica do pai da psicanálise, Sigmund Freud e de Carl Gustav Jung, criador da psicologia analítica. Contamos ainda com a visão dos artistas plásticos, como Marc Chagall e Salvador Dali, ambos envolvidos com o movimento surrealista do século XX, além de outros que, através dos seus sonhos, transportaram para as artes os reflexos surreais do subconsciente. Os textos sobre os sonhos e seus símbolos complementam as pesquisas sobre a paranormalidade, objeto da nossa análise.

         

Um sonho experienciado por Clarinha em 2002 marcou significativamente todo o período ‘retrospectivo’ das suas PES. Um sonho arquetípico cuja figura era a presença de uma criança de três anos caminhando na companhia de um mago oriental em direção ao sol nascente.A partir deste período, as suas subjetividades tornaram-se mais frequentes e evidentes.Entretanto, as preocupações de amiga com relação à enfermidade do seu tio Nilton, exigiram dela novas ações clínicas, em busca do pronto restabelecimento daquele familiar. Infelizmente com passar dos dias a esperança da cura se distanciava. Por outro lado, as mudanças efetuadas ao longo de alguns meses a ‘sabedoria divina’ se manifestou e tudo fluiu a termo e ordenadamente. 

 

Diante deste quadro assustador, Clarinha orientou a todos os familiares que se conectassem com o Poder Absoluto objetivando apoiar-se energeticamente e espiritualmente para assistir seu Tio Nilton, do ponto de vista “bio psico social” e espiritual. Como amiga e profissional de saúde sugerimos que ela recorresse às ‘meditações’ e outras práticas alternativas (USUI e REIKI), a fim de encontrar os ‘significados’ mais profundos da ‘cura como o caminho’ e igualmente para o reencontro da alegria do ‘existir. De modo saudável e mais fortalecido, dentro da inteireza do ‘ser’ enquanto habitante deste planeta. Neste processo, a amiga ‘intuiu’ que a maior parcela de apoio que a família necessitava poderia ser dela, como um ser espiritualizado, dinâmica e capaz de alcançar um final feliz naquele tempo de cura com aspectos difíceis e dolorosos.

 

Experienciar sutilezas pelos caminhos sagrados tem sido um dos objetivos dos estudiosos abaixo referidos em relação às conexões ‘mente matéria’, com o Absoluto (Deus). A título de reflexões aos leitores, inserimos na íntegra esta concepção: À medida que a concentração se torna mais estável a percepção e a concepção que temos de nós e do mundo gradativamente se transforma, e novas dimensões de insight intuitivo são revelados. Nosso senso de separação e isolamento dá lugar a um sincero senso de conexão, intimidade, interconexão, pertinência, empatia, respeito, amor e compaixão - por nós mesmos, pelos outros e pelo mundo e universo em que vivemos (JOEL LEVEY e MICHELLE LEVEY, 2004, p.74).

  

Neste espaço de tempo, Clarinha nos revelou que, devido ao assédio de percepções extras sensoriais, advindas daquele processo em sua vida, resolveu entrar em contato com um amigo sensitivo para dirimir suas dúvidas sobre os fenômenos “ditos ocultos” que a atormentavam diariamente em sua casa e em outras dimensões. Após o contato, conjecturamos que possivelmente a amiga estaria entrando em mais uma das etapas do seu ‘processo mediúnico’, apresentando-se mais sensitiva aos fenômenos do sobrenatural e como um seguimento da sua missão espiritual neste planeta. Diante do quadro assustador, o seu amigo sugere que Clarinha procurasse atendimento psicológico, porém ela não o fez.

   

Independente das sugestões daquele senhor, Clarinha ‘intui’ que a ‘meditação’ e o ‘acolhimento amoroso’ seriam as alternativa escolhidas por ela para auxiliar sua família a modificar as formas/pensamentos na busca dos objetivos propostos, a ‘cura’. Os pensamentos negativos mais presentes no dia-a-dia de todos mudaram, e a dinâmica do tratamento clínico, até então conduzido com a medicação ‘alopata, deu lugar às práticas espirituais e alternativas da clínica homeopática. E neste caminhar, um depoimento extraído do diário de Clarinha auxilia seu tio se religar com a ‘saúde’ do corpo, da mente e do espírito.     

             

Quando medito para conectar-me com o cosmo, faço inicialmente um ritual respiratório para alinhar os meus corpos sutis, denominado ‘chakras’. Conscientemente e sem temor, consigo adentrar nas profundezas da terra, com o auxílio do meu Eu Superior e em outras dimensões dos espaços siderais. No ato desse processo, recebo as instruções necessárias para o meu envolvimento sutil com aquele espaço circundante e consequentemente com o Universo para compartilhar com eles (familiares) na evolução do Planeta Terra. E, num estado de pura ‘magia e encantamento’, transponho alguns entraves no âmago da terra, pedras, metais e lençóis freáticos para depois posicionar-me sobre uma ‘pirâmide de cristal’ na ‘descida’(termo Junguiano). Um pedestal mágico, sólido e iluminado. Um espaço constantemente visitado em algumas circunstâncias da minha vida, para receber as instruções, de um Mago Oriental que me acompanha ininterruptamente a partir do meu renascer. Durante este ato, assimilo partes do meu aprendizado espiritual para trilhar pelo viés dos caminhos sagrados, em busca do conhecimento. Um processo no qual, sou submetida aos meus questionamentos e indagações sobre os mistérios do sobrenatural, cujo envolvimento me faz crescer e evoluir espiritualmente. Um vivenciar sutilezas no qual em estado de realidade psicofísica, sinto-me inteira na minha completude para prosseguir a missão, desprovida das ‘máculas de ‘ser’ ou ‘não ser’, uma pessoa “histérica ou louca”. (CLARINHA, 2002, p.21).

 

E, em outras partes do seu diário ela ainda acrescenta: Através da ‘meditação eu consigo entrar em sintonia com o Cosmo e me reencontrar com os mestres da espiritualidade. E nesse pensar sutilezas, posso reverter uma situação ‘perigosa ou indecisa’, em meu próprio benefício e/ou em benefício de outrem. Perceber a diferença sutil entre “miasmas, sonhos, ilusões e fantasias”. Compreender de certa forma o momento certo para retroceder ao meu espaço/tempo, a fim de vivenciar e contemplar a minha real dimensão dentro da realidade mundo. Sinto-me tal qual o ‘filho pródigo’ que, num dado momento, do seu existir, voltou à casa do Pai. 

 

As concepções sobre o ‘mundo’ da espiritualidade nos fizeram compreender que no ambiente familiar ocorreram outros níveis de sintonia vibracional mais elevada e o processo de cura de seu tio Nilton foi instalado. Aos poucos, percebemos na cura interior, sentimentos de alegrias. Clarinha tornou-se mais fortalecida e a sua paranormalidade testada em seus mínimos detalhes, direcionada pelas benesses das alegorias espirituais. Compreendemos que quando estes processos ‘mediúnicos e/ou enfermidades’ batem à porta de alguém, visa atingir um ‘bem’ maior e, neste caminho, felizmente o processo de ‘cura’ foi instalado. Por outro lado, Clarinha vivenciava também as suas PES e os “inexplicáveis fenômenos anômalos”, sem o apoio e legitimidade da ciência.

  

Por estas razões Francis Thompson (apud RADIN, 2006, p.14), poeta Inglês do século XIX, embalado talvez pelo poder da ‘intuição’ e, igualmente, com um sentimento ‘repleto’ de sabedoria transcendental, enfatiza a ‘interligação’ do ser humano com as ‘coisas’ sagradas do universo, quando adverte: “Todas as coisas, pelo imortal poder, tanto perto como longe, ocultamente estão umas às outras tão ligadas que não se pode uma só flor mover, sem que as estrelas sejam perturbadas”. 

 

A enfermidade de seu tio Nilton configurou-se em Clarinha a idéia de que o sofrimento do ‘corpo’ e da ‘alma’ humana, simbolizam o ‘viés’ para o cumprimento de uma missão ‘maior’ e ‘fraterna’, ou de um sintoma do que ainda estar por vir. Conseguiu conceber na sua visão de Cura, um ‘sinal divino’ para compreender que é preciso ‘transcender e transmutar’. E ainda absorveu que, somente assim o ‘mal’ se transforma no ‘bem’. De acordo com estas concepções pelas ‘coisas’ sagradas, a amiga conscientizou-se de que toda sintoma em relação a uma dor ‘física e extra-física’, é um sinal de alerta para a ‘alma’ de um ‘ser pensante’, em processo de evolução espiritual e cura interior.

 

Em sua obra “A Doença Como Caminho” o médico Thorwald Dethlefsen e o psicólogo Rudiger Dahlke descobriram em suas ações que é necessário ‘um sinal de alerta’ na vida do ser humano nas questões que envolvem o ‘espírito’, a ‘mente’ e o ‘corpo físico’. Estabelecer com eles, formas/pensamento em busca do conhecimento. Encarar a doença não somente como um ‘fardo pesado’ mas, sobretudo, como um caminho a ser trilhado com todas as regras da sabedoria universal. A doença do corpo físico é uma oportunidade de detectar outros significados para as nossas vidas como, por exemplo, a ‘cura da alma humana’ e/ou resgatar débitos’ de vidas passadas. Esses estudiosos ainda enfatizam que a ‘doença como caminho’ é um verdadeiro ‘apelo’ para uma tomada de decisão e ou um ‘ponto de mutação’ que envolve os novos paradigmas da espiritualidade na direção da ‘cura interior’. Em conformidade com esta visão eles se expressam em seus escritos de cura:

 

Este livro, ao contrário, deseja tornar claro que a doença é muito mais do que uma mera disfunção natural. Na verdade, ela faz parte do sistema de controle total que no momento atual se destina a estimular a nossa evolução. Não se devem livrar os seres humanos da doença pela simples razão de que a saúde de fato precisa dela por ser o seu par polarizado complementar [...] O homem está doente porque lhe falta a Unidade. O homem sadio, ao qual não lhe falta nada, só existe nos livros de medicina.Na vida, não se conhece nenhum exemplar desses [...] Estar doente, neste contexto, significa ser imperfeito, inseguro, vulnerável e mortal (DETHLEFSEN e DAHLKE, 2007, p.57).

 

Compreende-se que um ‘olhar interior’ através deste prisma mudou o quadro clínico do seu tio Nilton. Funcionou como ponto de partida para uma nova visão do ‘mundo interior’, das pessoas ‘doentes’ ou ‘sadias’, em relação às enfermidades do espírito, da mente e do corpo físico. Foi percebido também que a amiga se envolveu mais no contexto familiar, a ponto de se fragilizar na sua completude e inteireza. Ficou susceptível às energias densas e, em determinadas ocasiões do seu existir, mostrava-se parcialmente ‘exaurida’. Seus projetos de vida tornaram-se mais lentos. No entanto, com o decorrer do tempo compreendeu nestas ‘revelações divinas’ que como seres humanos não somos ‘perfeitos’, ‘cultos’, ‘culpados’ ou ‘pecadores’. Somos apenas o resultado do “micro cósmico da Queda”. No caso a ‘descida’, uma ‘atitude’ do ponto de vista Junguiano. Diante deste quadro existencial, ficou configurado que a ‘doença’ não é um ‘castigo’ para o corpo físico, mas simboliza a ‘forma’ de manifestações solidárias do amor ao próximo, do amor a si mesmo. Sentimentos interiores que coadunam com o pensamento dos citados:

 

“[...] Enquanto participarmos da polaridade, também participará da culpa, da doença e da morte. Assim que aceitarmos esses fatos, eles deixam de ter quaisquer conotações negativas” (DETHLEFSEN e DAHLKE, 2007, p.57).  

    

Com o desencadear do processo de cura de seu tio, Clarinha vivencia mais intensamente o mundo interior e o fez com sabedoria e mestria. Sonhava diariamente, e os seus sonhos se referiam aos mesmos eventos, às mesmas situações, às mesmas pessoas e aos mesmos cenários, algo conhecido como “incursões aleatórias do inconsciente”.

  

Sonhar é uma experiência universal, poderosa e cheia de mistérios. Devido a amarfanhados de sentimentos, os conteúdos dos sonhos constituem verdadeiros significados para o psiquismo daquele indivíduo sonhador. Compostos de fragmentos de “imagens errantes” e complicadas, eles podem assumir no nosso existir, aspectos benignos, demoníacos ou, ainda induzir um terror capaz de acelerar os batimentos cardíacos, quando se povoam de ‘monstros horripilantes’ de pessoas queridas e amadas.

 

Diante destas considerações, o território “enevoado” entre o despertar em consciência e no mundo sutil no qual entramos enquanto adormecidos, é um tema que permeia o existir humano, constituindo fonte de pesquisas e inspirações de alguns estudiosos da história psíquica dos nossos dias. Embora as características dos sonhos, sejam conhecidas e experienciadas, insistem e persistem ‘intrigantes indagações’ a respeito destes fenômenos que permanecem vivos no interagir do mundo.

 

Afinal o que são os sonhos? Qual o seu significado para a humanidade sonhadora? O que eles representam para o psiquismo do ser humano? Para os povos antigos, gregos e egípcios, os sonhos correspondiam às mensagens dos deuses às mentes adormecidas. De certo modo, quaisquer que sejam as nossas crenças sobre a existência deste simbolismo e em respostas a estas indagações, tentaremos mostrar, ao longo dos próximos parágrafos o que os sonhos representam no interagir das pessoas, pois na visão das sociedades antigas, os sonhos ecoaram como conteúdos do mundo sobre-humano nos quais acreditavam, onde os poderes de prever o futuro eram revelados por deuses e demônios. Entretanto, baseado em sua autobiografia, o cientista das causas profundas do inconsciente assim se expressa:              

 

O sonho é uma porta estreita, dissimulada naquilo que a alma tem de mais obscuro e íntimo; essa porta se abre para a noite cósmica original, que continha a alma antes da consciência do eu e que a perpetuará muito além daquilo que a consciência individual poderá atingir. Pois toda consciência do eu é esparsa; distingue fatos isolados, extração e diferenciação; só o que pode entrar em relação com o eu é percebido. A consciência do eu, mesmo quando aflora as nebulosas mais distantes, é feita de enclaves bem delimitados. Mediante o sonho, inversamente, penetramos no ser humano mais profundo, mais geral, mais verdadeiro, mais durável, mergulhando ainda na penumbra da noite original, quando ainda estava no Todo, e o Todo nele, no seio da natureza indiferenciada e despersonalizada (JUNG, 2006, p.496-497).   

   

Sonhos: Ilusões ou Linguagem Esquecida? 

 

Nos primórdios da humanidade, os sonhos significavam as ‘sombras’ ou as ‘máscaras’ escondidas que usamos para os outros. Quando adormecidos nos mostramos a nós mesmos outros aspectos o do ‘oculto e sombrio’ das nossas personalidades. Entretanto, de acordo com os críticos das artes plásticas e estudiosos do psiquismo humano, o fato de querer saber com que sonhamos ainda nos fascina. Nos dias atuais a distinção entre ‘realidade e ilusão’ às vezes são tão reais quanto qualquer evento ocorrido, enquanto acordados.

 

De modo sábio a ex-discípula de Jung expressa que, a grande descoberta da psicologia profunda, foi pontuar que de cinco ou seis vezes por noite a parte inconsciente da psique é retratada nos sonhos e que ao relembrá-los, a mente consciente tem a oportunidade de observar os conteúdos da mente inconsciente:

 

[...] um sonho revela o inconsciente sob a forma de imagem, metáfora e símbolo, numa linguagem intimamente associada à da arte. Longe de ser exposições objetivas e prosaicas, os sonhos costumam ser confrontos altamente subjetivos e pessoais nos quais o ego, ‘o eu’, sente emoções que vão do medo e hilaridade à sensação de sublime paz e beleza. Assim como as peças teatrais, os poemas e a pintura, a linguagem dos sonhos transmite o poder e a sutileza tanto dos sentimentos como do pensamento racional (Von FRANZ, 1990, p.35-36). 

   

Ainda neste contexto compreendemos que o sonho quer queiram ou não, representam conteúdos importantes que reverberam em nossas vidas e consequentemente na nossa inconsciência. Nas antigas civilizações, por exemplo, estes conteúdos foram estudados com rigor por acadêmicos. Por outro lado, complicados livros de sonhos foram igualmente manuseados por respeitáveis interpretadores. Na antiga literatura Chinesa, foram registrados outros seguimentos sobre este material onírico, mostrando as várias maneiras como eles se vinculam à existência consciente (INCE et  al., 1992).

 

A parir de nossos estudos e pesquisas sobre este tema, compreendemos que o confronto entre ‘realidade e ilusão’ não se limitou apenas aos pensadores Orientais. Os estudiosos da Grécia Antiga concebiam nesses simbolismos, fenômenos extremamente sérios e tinham como pilares os poderes dos Oráculos. Deste modo, aqueles pensadores acreditavam nos sonhos como a oportunidade das suas mentes receberem enquanto adormecidas as mensagens dos deuses.

  

Considerando esta sabedoria Oracular dos povos antigos ficou entendido que o confronto entre a ‘realidade e ilusão’ não foi apanágio exclusivo dos pensadores Orientais. Visto que alguns filósofos clássicos gregos chegaram à mesma encruzilhada em relação ao mundo dos sonhos. Para eles o confronto entre ‘realidade e ilusão’ ultrapassou as barreiras do mundo oriental.

 

No Teaetetus de Platão, Sócrates indagou: “Que provas você daria a alguém que nos perguntasse agora, no momento presente, se estamos adormecidos e nossos pensamentos são um sonho; ou se estamos acordados e conversando em condições de vigília? Depois em Teaetetus admitir que ambos estiverem dormindo, Sócrates continuou: “Como você vê, ainda está aberta a questão: estamos acordados ou sonhando? (INCE  et  al., 1992, p. 24).       

 

No Talmud Hebraico, por exemplo, está escrito: “um sonho não interpretado é como uma carta que não se lê” (INCE et  al., 1992, p.23). 

     

Na Nova Guiné, a tribo dos Kai e os ashanti da África Ocidental, conseguiram equipar os seus sonhos à realidade circundante. Para estes povos até manter relações sexuais em sonho, era um ato de adultério e o sonhador poderia ser punido com todo o rigor da lei. Por outro lado, constatamos que os Zulus Africanos, têm outra visão quanto ao mundo dos sonhos. Sustentam em suas crenças que eles representam uma ‘ação onírica’, ou seja, são vistos por aqueles como espíritos ancestrais e que podem avaliar o comportamento dos vivos, com os sentimentos de aprovação ou desagravo (INCE  et  al., 1992, p.24).

  

Nos dias atuais, o ser humano ainda rejeita seus sonhos como algo sem sentido. Entretanto, para outros, este material onírico é a ‘linguagem esquecida de Deus’ e/ou a ‘linguagem do demônio’. Diante destas observações, consideramos que todo esse material submerso nos reinos da subconsciência, são conteúdos importantes na vida de um ‘ser pensante’ e estão relacionados diretamente à psicologia de cada ‘ser’, individualmente. Daí conclui-se que não somente os povos antigos como os nossos contemporâneos, precisam trabalhar os seus sonhos no divã do analista ou psicoterapeutizados em grupos de auto-ajuda.   

 

Quer dizer, os sonhos seguem em sua estrutura determinados ‘valores, crenças espirituais e tradições’, e se originam das mensagens deixadas pelos deuses, cujo trabalho pioneiro deve-se a Jung, ao conceber que através dos conteúdos oníricos o inconsciente emerge de uma forma bastante clara. Os estudiosos abaixo relacionados oferecem uma concepção sobre o papel da interpretação dos sonhos, que adverte:

 

“Sem uma acurada atenção às relações externas das imagens do sonho (sobretudo uma série de sonhos) o analista estará correndo o perigo de projetar sua própria teoria no material do paciente (JAMES A. HALL, 2007, p.43).                                

 

A partir desse referencial onírico, encontramos importantes figuras da nossa história, como Alexandre, o Grande, René Descartes, Elias Howe e Robert Louis Stevenson, que prestaram os seus depoimentos a favor dos sonhos. Para eles os sonhos forneciam um rico material a realização dos seus ideais. Quer dizer, as imagens noturnas significaram, enquanto conteúdos do inconsciente, as portas que se abriam para as outras dimensões, ou um passaporte para contemplar uma realidade completamente diferente do ‘existir’ (INCE et al.,1992, p.23).

 

De acordo com Ubaldo Nicola em “Antologia Ilustrada de Filosofia” (2002, p.374), o próprio Arthur Schopenhauer ao referir-se aos seus sonhos se expressou: “O conteúdo do sonho nunca é totalmente ilógico e principalmente, nunca imotivado, porque depende dos desejos, das imagens recentemente percebidas, da experiência real do sonhador”. 

 

De conformidade com o material onírico, acima mencionado, podemos concluir que os sonhos fazem parte do nosso existir e na virada do século XIX para o século XX, os pioneiros da psicologia profunda[26] não descobriram os sonhos, pelo contrário, eles os ‘redescobriram ’como um simbolismo que têm refletindo os ‘valores e as estruturas picos-sociais’, de diferentes culturas, a partir dos povos antigos até os dias atuais.

 

De qualquer sorte os sonhos dos artistas daquele período, apresentavam uma composição de fragmentos de imagens, muitas vezes complicadas, que desenrolavam diante das suas mentes como na projeção de um filme. Episódios surreais que, na maioria das vezes, assumiam ‘papéis delirantes, ‘aspectos leves ou densos’, ‘benignos ou malignos’, e ainda suscitavam batimentos cardíacos acelerados. Na íntegra, a concepção científica de Jung, um pintor humanista que transmitiu às artes plásticas os seus sentimentos interiores:

 

Os sonhos não são invenções intencionais e voluntárias, mas, pelo contrário, são fenômenos naturais que não diferem daquilo que representam. Não iludem, não mentem, não deformam, não encobrem, mas comunicam ingenuamente o que são e o que pensam [...] Mas quer sejam originais ou difíceis, a experiência demonstra que sempre se esforçam por exprimir algo que o eu não sabe e não compreende (JUNG, 2006, p. 497).

 

Os Sonhos na Visão de Freud e Jung

 

Para o pai da moderna psiquiatria, Sigmund Freud os sonhos são criados pelo cérebro e serviriam de ‘janelas’ para a psique, revelando um esconderijo de desejos insatisfeitos. Hoje os seus seguidores consideram tais visões como uma das maiores ferramentas da psicanálise contemporânea (INCE et al., 1992).

 

Freud concebia que os sonhos serviriam para jorrar um pouco de luz na escuridão do processo mental. Portanto o seu famoso livro “A Interpretação dos Sonhos” tornou-se um compêndio de cabeceira para um grande número de estudiosos da mente humana. Neste sentido, inserimos um conceito Junguiano relacionado ao ‘mundo dos sonhos’ com todo simbolismo e seus mistérios em violento contraste com Freud. Jung acreditava que os sonhos têm uma forma peculiar de comunicação, quase direta, objetiva. Para ele a mente noturna não tem necessidade de ocultar sua compreensão sob uma camuflagem simbólica para disfarçá-la aos olhos vigilantes do superego. O dispositivo de censura descrito pelo psicanalista Freud simplesmente não existe, afrontava Jung:

 

“Não há razão alguma pela qual possamos afirmar que o sonho consiste em um expediente engenhoso para desviar-nos do bom caminho, declarou” (INCE et al.,1992, p.72).

Jung (2006) observou em seus sonhos e nos dos seus pacientes, ‘conteúdos inconscientes’ significativos que regulam e equilibram as energias físicas e mentais do‘ser pensante’, dotado de inteligência e vontade, enquanto no seu processo onírico existencial. Ao enfatizar esta visão, ele concebe que, os mesmos só são irritantes e enganadores se não os compreendermos. Não utilizam artifícios para dissimular alguma coisa, contudo dizem à sua maneira o que constitui o seu conteúdo de maneira mais nítida possível.

 

Para o empirista dos sentimentos profundos, os sonhos não são somente invenções intencionais e voluntárias, pelo contrário, são fenômenos naturais que não diferem daquilo que representam. São produtos psíquicos que surgem na vida do ser humano, sem motivação consciente, no estado ‘hípinico’, dotado de ‘natureza pura’ e, igualmente, tem uma tarefa muito importante no existir das pessoas quando sabiamente administrados à luz da psicanálise. De acordo com Freud, a tarefa imediata dos sonhos é a de compensar a unilateralidade da consciência considerando o ‘conhecimento do ‘pré-consciente’ oculto, da psique coletiva.

 

No contexto psicanalítico compreendemos que ‘sonhar’ significa vivenciar ‘momentos de sabedoria’, porque neste experienciar sutileza está contida um ‘simbolismo’ e uma verdade compensatória de que existe ‘algo muito mais profundo’ nos porões do inconsciente. Jung (2006) enfatiza esta visão e os concebe que os mesmos só são irritantes e enganadores se não os compreendermos. Não utilizam artifícios para dissimular alguma coisa, contudo dizem à sua maneira o que constitui o seu conteúdo da maneira mais nítida possível.

 

Para fortalecer cada vez mais a ‘idéia’ de que o‘ato de sonhar’ é vital para o psiquismo humano, apresentamos a visão onírica da ex- discípula de Jung:       

 

Cada sonho que temos, dentre milhares no decorrer da nossa vida, é único. Uns são diretos, outros mais complexos, mas todos os sonhos são espontâneos e imprevisíveis. É, portanto surpreendente observar que muitos deles têm uma estrutura identificável, um arcabouço a partir do qual se organizam (Von FRANZ, 1990, p.44).   

 

Uma declaração que é respaldada na teoria analítica: “O sonho provém dessas profundezas, onde o universo ainda está unificado, quer assumam as aparências mais pueris, as mais grotescas, as mais imorais” (JUNG, 2006, p.497).

 

De qualquer sorte, os sonhos são conteúdos que se processam na vida das pessoas como um produto psíquico.Jung ainda adverte que quando o ser humano está sonhando a consciência não se apaga por inteiro durante o sono.As pessoas quando sonham mantém uma pequena parcela do seu ‘eu’ ativado, embora seja um ‘eu’ muito limitado.Estranhamente modificado, conhecido como ‘eu onírico’.

                        

Pesquisando o ‘mundo dos sonhos’, identificamos o perfil psicológico de alguns pintores que foram seriamente influenciados pela obra de Sigmund Freud e pelo movimento surrealista, desencadeado na Europa, durante a década de 1920, enfatizando os sonhos. Os artistas plásticos, daquela época, consideraram nesse movimento surreal uma oportunidade de pesquisar os sonhos e a subconsciência. Simpatizantes das subjetividades, eles buscavam a ‘transcendência do mundo do pensamento consciente’ ou da ‘realidade’. Exerciam as suas manifestações ‘surreais’, através do exercício das obras sob ‘a visão do subconsciente’, como acreditavam. André Breton, poeta francês que se auto-intitulava porta voz desse movimento assim se expressou, em certa ocasião referindo-se aos objetivos do surrealismo:   

 

“A resolução futura desses dois está-sonho e realidade, - tão contraditórios na aparência, numa espécie de realidade absoluta: a surrealidade” (INCE, et  al., 1992, p.7).

 

Naquela época os pintores transferiam para suas ‘telas brancas’ elementos simbólicos de sonhos comuns. Uma arte carregada de subjetividades, cujos desenhos criativos e aplicados de modo livre, exprimiam os conteúdos da psique inconsciente. Verdadeiros ‘pigmentos com arte’ da ‘ação criativa’ que inconscientemente sofriam ‘distorção’ ou ‘justaposição’ para posteriormente assumirem um ‘simbolismo especial’, originário das profundidades do ser. Através do manuseio do pincel os matizes daqueles artistas tornavam-se ‘explícitos’. As ocorrências mistas do passado, do presente e do futuro desapareciam quase por completo do ‘cenário surreal daquela obra’, para dar espaço às leis naturais que governam a ‘realidade psicofísica’. E desta forma os métodos e técnicas da arte acadêmica tornavam-se sem efeito.

 

Von Franz (1988) costuma pontuar que os sonhos não nos poupam das doenças e demais vicissitudes da vida. Entretanto, todos eles têm um lado benigno quando nos fornece uma “linha mestra” de como exercitar esses processos, no sentido de encontrar uma saída para uma variedade de questionamentos sutis e adverte:

 

“Os símbolos são a linguagem dos sonhos. Nos sonhos, o inconsciente é revelado através de símbolos. A chave para a compreensão de um sonho é o conhecimento dos símbolos” (Von FRANZ, 1988, p.55). 

 

Por este prisma, entende-se que os sonhos nos fazem cumprir o nosso destino, durante o curso da existência, em busca da nossa ‘própria estrela’. Funcionam, sobremaneira, como verdadeiros pontos reguladores do equilíbrio das energias físicas e mentais quando estamos adormecidos. Desempenham um papel fundamental de revelar a causa das nossas angústias emocionais, enquanto indicam um potencial latente que existe em nós para cumprir tarefas pertinentes ao existir humano. Portanto, diante desta contextualização científica, compreendese ainda que os sonhos nos forneçam soluções criativas para a equação de problemas e dificuldades existenciais, quando dormimos e/ou até mesmo acordados.  

 

Para a maioria dos pesquisadores das percepções oníricas e repetindo concepções antigas, as subjetividades das noites cósmicas, funcionam como um elemento psíquico revelador das forças do destino ou um processo do que ainda estar por vir. Compreende-se também, que as crenças relacionadas a elas, fazem com que os seres humanos busquem os significados de vida, cuja lógica está escondida por baixo das camadas de simbolismo e de metáforas.

 

Outros estudiosos deste tema teorizaram sobre o fato de que os sonhos possam constituir pedaços de informação desnecessária e que durante a noite são expurgados da memória de uma pessoa, assim como é possível eliminar os dados descartáveis do arquivo de um computador.        

 

Os Dons Artísticos de uma Sensitiva

       

A partir dos inúmeros contatos com Clarinha para pesquisar os temas sobre a paranormalidade, mediunidade, Psicologia Analítica, Sonhos, Artes Plásticas e ‘mistérios’ que envolvem o ato de pintar, compreendemos que o ‘dom das artes plásticas’ pode ser alimentado pela ‘intuição’, ‘imaginação criativa’, ‘sonhos’ e ‘espontaneidade’. Sentimentos originais do ser humano que é ‘sensitivo-criativo’, que usa o hemisfério direito do cérebro para elaborar suas obras de arte, enquanto enraizado nos seus ‘arquétipos ou memórias ancestrais’.Neste vivenciar sutil o cientista das subjetividades, do ‘mundo das artes’ e da ciência enfatiza:   

 

Atrás da consciência não se encontra o nada absoluto, mas sim a psique inconsciente que afeta a consciência por trás e por dentro, da mesma forma, como o mundo externa afeta a consciência pela frente e de fora. Portanto, os elementos pictóricos que não correspondem a nenhum lado externo devem provir do íntimo (JUNG, 2007, §207).

 

Seguindo considerações psicológicas do ser humano no ‘aqui e agora’, tentaremos mostrar o perfil de Clarinha em seus relacionamentos individuais, como membro de grupos e comunidades. Dotada de um temperamento ‘extrovertido’, ‘criativo’, ‘sensitivo’, ‘alegre’ ela vive de bem com a vida. Quando está pintando, consegue transmitir às suas obras sentimentos surreais e que se afloram a partir do inconsciente. Em alguns segundos, ela consegue, através de movimentos rápidos e sem sentido, transmitir às obras pigmentos com arte, desprovidos dos métodos e técnicas acadêmicas, que se assemelham às pinturas dos artistas surrealistas daquela época. 

 

É provável que Clarinha elabore suas telas quando se fazem presentes às ‘fantasias e intuições exacerbadas’, um sentimento, talvez, originário do seu “eu interior”. Quer dizer, quando a sua mente se expande, transpondo os longínquos recantos do seu mundo inconsciente. Esta razão a levou identificar-se com Jung, nas questões do simbolismo das artes, da mente, do espírito e nas prováveis intenções desse cientista de querer legitimar a sua própria paranormalidade.

 

Nos inúmeros contatos com a amiga conseguimos identificar o seu perfil psicológico, tomando por base a teoria de profundidade de Jung (2006), quando elaborou os ‘tipos psicológicos’ do ser humano, nas diversas formas de ‘ser’, ‘agir’ e ‘pensar’ sutilezas. Por estas razões, as duas atitudes básicas, a Extroversão e a Introversão, e as quatro funções: pensamento, sentimento, sensação e intuição, serviram de parâmetros para que Clarinha identificasse o seu próprio perfil e, igualmente, a sua principal função psicológico. Jung descreveu o ‘Sentimento’ como ‘racionais’, os atos de julgamento. Enquanto que a ‘Sensação e a Intuição’, ele as consideraram ‘não-racionais’, no caso, as respostas aos estímulos sem juízo.

                 

Para Silveira (2001), os ‘tipos psicológicos’ são frutos das experiências do cientista, por ocasião das suas observações às diferenças psíquicas do ser humano, em seus relacionamentos com o mundo e com o Universo. Por outro lado Jung pontuou que estas diferenças psicológicas, uma vez identificadas no existir humano, contribuiriam para avaliar o comportamento das pessoas no processo de adaptação consigo mesmo e/ou na sua adaptação ao meio ambiente. Sendo que cada indivíduo direcionaria a sua‘função principal’ e a identificaria como tal no exercício das suas ações. 

 

No vivenciar deste processo, Jung advertiu que uma segunda função entra como apoio à primeira, exercendo um grau de diferenciação para ‘mais ou para menos’, nas diversas formas de relações com o mundo. Deixou claro e evidente que uma terceira função comporia esse perfil que não vai além de um desenvolvimento rudimentar. A quarta função psicológica permaneceria então num estado, mais ou menos inconsciente, a que Jung conceituou como ‘função inferior’. Importante conferir na integra os conceitos:   

 

[...] na introversão, um fluxo de energia inconsciente está constantemente enfrentando energia ao objeto [...] O conceito de extroversão e de introversão baseia-se na maneira como se processa o movimento da libido (energia psíquica) em relação ao objeto. Na extroversão a libido flui sem embaraços ao encontro do objeto, pois este parece ter sempre em si algo de ameaçador que afeta intensamente o indivíduo [...] Extroversão e introversão são ambas as atitudes normais. Claro que a introversão em grau exagerado tornar-se-á patológica do mesmo modo que a extroversão excessiva será também característica de estado mórbido (SILVEIRA, 2001, p.46).

 

Ficou entendido que as observações de Jung sobre atitudes e funções psicológicas, oferecem subsídios que contribuem sobremaneira para que essas diferenças individuais‘funções psíquicas’, facilitem às pessoas o poder de adaptar-se ao mundo exterior. As quatro funções básicas podem ser consideradas funções de adaptação sinalizando ainda ‘pontos cardeais’, vez que utilizados pelas pessoas para se reconhecerem como ‘ser pensante’, diante do mundo e notadamente orientar-se.

 

A sensação constata a presença das coisas que nos cercam e é responsável pela adaptação do indivíduo à realidade objetiva. O pensamento esclarece o que significam os objetos. Julga, classifica, discrimina uma coisa da outra. O sentimento faz a estimativa dos objetos. Decide do valor que têm para nós [...] A intuição é uma percepção via inconsciente. É a apreensão da atmosfera onde se movem os objetos, de onde vêm e qual o possível curso de seu desenvolvimento (SILVEIRA, 2001, p.48).  

                 

Seguindo os pressupostos da ‘intuição’, do ‘sentimento’, da‘criatividade’, da ‘espontaneidade’ e, igualmente, nos estágios no modo de interagir com os seus pares no grupo familiar e através dos vínculos amigáveis, entendemos que Clarinha se ajusta ao tipo psicológico ‘extrovertido’, pelas suas ‘formas pensamentos’. 

 

As considerações acima referidas atestam que ela é prioritariamente uma pessoa ‘intuitiva’, com prevalência da ‘função básica da Intuição e Sentimento. Este perfil psicológico foi identificado por ela através da sua ‘individuação. Passou a se entender mais e melhor consigo mesma e com os seus pares, enquanto interagindo sabiamente como um ‘ser’ individual, grupal e comunitário.

 

O temperamento Extrovertido de Clarinha tem conotações da leveza e da liberdade, nos seus relacionamentos com o mundo e com o Universo. É com este temperamento, ‘sensível e intuitivo’ que a amiga elabora suas telas dissociadas das regras acadêmicas.

 

A título de ilustração desta monografia inserimos na íntegra, um dos momentos da vida de Clarinha quando foi submetida a um ‘teste seletivo’, para concorrer a uma vaga no curso nas Oficinas do Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM) no ano de 2005. Na proposta do conteúdo programático do curso, o candidato passaria pelo processo de seleção levando consigo a sua própria obra para ser ‘avaliada’ pela docente. Caso o candidato fosse aprovado no teste, tornar-se-ia um membro do curso e estaria habilitado ao ingresso das práticas do Desenho Criativo[27].

  

A aprovação de Clarinha para o curso do MAM transformou-a numa mulher feliz e alegre, pela possibilidade de exercitar a sua arte dentro das técnicas acadêmicas e do Desenho Criativo. Participando daquelas oficinas, a amiga pretendia tornar-se mais consciente das suas ações, porque se definia ‘autodidata’ na construção das suas Obras. No entanto, o ingresso naquelas oficinas não modificou o seu modo de fazer artes Plásticas. Os sentimentos da sua ‘alma’ continuaram os mesmos, porém tornaram-na bastante feliz pelas ações do dever cumprido. Quando indagada sobre a forma como ela elabora as telas, costuma se expressar: “Não sei” Simplesmente acontecem! Como Jung, Clarinha revelou, em certa ocasião, que desenvolve artes plásticas movida por um mecanismo ‘interior’, um sentimento similar ao dele, quando em suas subjetividades, elaborou ‘mandalas’. Nesta visão pelo mundo das artes Jung enfatiza: 

 

A obra de arte desta espécie não é a única que provém da esfera noturna, os visionários e profetas dela se aproximam, como diz com muito acerto S. AGOSTINHO. ‘E subíamos ainda, cogitando interiormente, conversando e admirando as tuas obras; e entramos em nossas mentes e as transcendemos, atingindo a região da fecundidade que não falha, onde alimentas eternamente Israel com o alimento da verdade e onde a vida é sabedoria’ (JUNG, 2007, §149).

                  

Diante de tantas subjetividades pelo mundo das artes concluímos que os artistas ‘sonhadores’ criavam suas obras motivadas pelos momentos de uma ‘loucura simulada. Entre eles Henri Rousseau, Paul Delvaux e René Magritte, os pintores surrealistas mais significativamente influenciados pela tese psicanalista de Sigmund Freud. Neste contexto ainda podemos observar que a amiga se identifica com alguns artistas surrealistas, e também com Jung, pelo seu modo de ser e de construir sutilezas ao sabor dos ventos e correntezas.

 

Como Jung, Clarinha e tantos outros artistas demonstraram em suas obras sentimentos surreais e quase nas mesmas dimensões de sentimentos. Afinal o que é que entra no jogo das sutilezas dos artistas: imaginação criativa?  Intuição?Conteúdos e ou fragmentos perdidos no subconsciente? 

 

Segundo os registros na História da Arte, o pintor daquela época interessava-se em entender os conteúdos dos seus sonhos influenciados pelo movimento surrealista e pela teoria de Freud. A ciência que pesquisa os sonhos e o subconsciente no interagir das relações humanas, enquanto agente da realidade psicofísica. No entanto, esses pintores quando elaboravam as suas telas, buscavam transcender o ‘mundo’ do pensamento inconsciente. Enquanto utilizam os elementos dos seus sonhos e dos objetos corriqueiros, eles distorciam as figuras num processo da ‘justaposição’, destes elementos para traçar os símbolos que davam originalidade à sua arte. Dentro deste esquema surreal, as ocorrências do presente, do passado ou do futuro, extrapolavam todas as leis que governam a realidade física.   

 

Na tela de Rousseau intitulada ‘O Sonho’, de 1910, conseguimos identificar nesse artista um sentimento surreal, ou seja, um comportamento que foi regido pelo mundo dos sonhos, no qual ele retratou a imagem de uma mulher exótica, despida e ao mesmo tempo deitada num sofá em plena floresta, de um jardim botânico de Paris. A paisagem enluarada da sua tela nos deixou transparecer que esse pintor inseriu na sua obra conteúdos inconscientes, como as folhagens verdejantes, um ‘encantador de serpentes’ e, ainda, alguns animais selvagens a espreitar a realidade circundante. Em carta a um crítico de artes que o questionava deu a seguinte explicação:

 

“A mulher adormecida no sofá está sonhando que foi transportada para a floresta [...] Quando entro nestas estufas e vejo essas plantas estranhas, de países exóticos, Comentou Rousseau certa vez, ‘sinto-me como se estivesse caminhando dentro de um sonho’” (INCE et  al.,1992, p.8).   

 

Por sua vez, Marc Chagall pintava as suas obras auxiliadas pelas suas visões líricas e nos instantes dos seus sonhos, costumava revelar aos seus expectadores o seguinte depoimento: “Parece-me uma janela através da qual eu poderia levantar vôo em direção ao outro mundo. E outro mundo - um lugar mágico, onde o prosaico se mistura ao fantástico” (INCE et tal 1992, p.10).

 

Na sua obra intitulada “A Sala Amarela”, de 1911, foi observada que sob a ‘tela branco’, o artista desenhou uma mesa posta para o chá, onde a perspectiva não se apresentava dentro das regras do desenho acadêmico. A mesa desenhada pelo artista está inclinada como num sonho e, que se fosse uma mesa real, os objetos sobre ela, a ‘xícara e o samovar’, cairiam devida a inclinação daquela. Por sua vez, a figura feminina que compõe o cenário artístico da obra, está com a cabeça presa ao seu corpo, de ‘modo contrário’. Enquanto que a figura masculina apresenta-se sem identificação e totalmente desfigurada em sua plástica, faltando-lhe os‘olhos, a boca e os cabelos’. Os comensais ao redor da mesa se completam com a presença de uma vaca. Nesta obra, percebemos objetos em vários planos e tremendamente desconcertantes para os expectadores de um museu de Artes Plásticas.

 

Como Chagall, Delvaux retrata também os instantes mentais do seu inconsciente pintando “O sepultamento”, de 1957. Uma tela surreal, que permeia uma imobilidade reverberante, segundo os historiadores do movimento surrealista. O artista criou na sua arte, às figuras dos esqueletos o símbolo da ‘doença ou da incompreensão’. Para Delvaux, as‘ossadas’ pigmentadas na sua obra, não representam a morte, mas “a estrutura que sustenta o ser humano - a criatura viva” (INCE et al., 1992, p.15).

                         

Em tempo das artes plásticas, inserimos neste texto algumas considerações sobre o comportamento surreal de Dali. Um artista que se dedicou de corpo e alma à obra de Freud e concebeu na teoria deste, um ‘viés’ para as explicações científicas que ele precisava para equacionar os seus problemas e dificuldades existenciais as quais, ele próprio costumava revelar. No caso, problemas e tormentos eróticos vivenciado por ele quando criança. 

 

Portanto, a sua relação com a psicanálise foi a ponte científica que o auxiliou a lidar nas suas questões emocionais e psicológicas em seus ‘momentos críticos’. A história das artes nos revela que Dali simulava “loucuras ou paranóias”, a fim de extrair do‘subconsciente’ imagens que ele precisava para construir as suas obras.A partir deste processo ‘freudiano’, como a ‘livre associação’, o pintor “catalão”adicionava à sua arte imagens sugeridas pela forma inicial, cujos resultados criavam mundos de sonhos tangíveis e reais, quanto às cenas do seu existir cotidiano.

 

Para concluir este vivenciar sutil com o auxilio das artes plásticas ficou compreendido entre os analistas Junguianos, que experienciar sonhos e ainda auxiliados com as práticas terapêuticas, o ser humano busca a sua completude e tenta se redescobrir de modo psicossocial. Por outro lado, restaura o equilíbrio do seu ‘ser’ sonhador. Jung aceitava a interpretação dos sonhos como uma alternativa da sua teoria embora lembrando que existem nos sonhos uma ‘figura-chave’. Com o apoio de um terapeuta, esta ‘figura’ nos fornece subsídios para interpretarmos as nossas próprias subjetividades e, igualmente, entender os seus significados, aqueles submersos nos porões do inconsciente.

 

Uma Jornada Arquetípica Pelo Viés da Existência      

 

Na Psicologia Analítica, os sonhos representam os conteúdos do inconsciente que tiveram as suas origens dos depósitos deixados pela convivência nos relacionamentos humanos repetidos através de milênios. Os conteúdos que foram criados pelas emoções, nas experiências do homem com a mulher e vice versa. E, ainda, nas travessias de mares, rios e até transposição de montanhas, cujos seguimentos existenciais deram origens aos arquétipos do inconsciente coletivo. 

 

Neste sentido Jung (2006, p. 485-486), se expressa: 

 

O arquétipo em si mesmo é vazio; é um elemento puramente formal, apenas uma facultas praeformandi (possibilidade de pré-formação), forma de representação dada a priori. As representações não são herdadas; apenas suas formas o são [...] Não devemos entregar-nos à ilusão de que finalmente poderemos explicar um arquétipo e assim “liquidá-lo”. A melhor tentativa de explicação não será mais do que uma tradução relativamente bem - sucedida, num outro sentido de imagens.

 

Já referimos que para alguns povos antigos o ato de sonhar é uma experiência universal e extremamente importante para a riqueza do psiquismo humano. Tão importante para as nossas vidas quanto o ar que respiramos. Entendemos que todos os seres humanos dormem e todos sonham nas ‘caladas das noites cósmicas’, e na interpretação dos estudiosos do tema, os sonhos são capazes de ‘imitar a realidade’, e neles estão contidos fragmentos dessas imagens. As visões sutis do sonhador parecem deturpadas e podem assumir aspectos benignos, ou inspirar outras conotações como a de ‘um terror’ que contribui para aumentar os batimentos cardíacos, enquanto adormecidos.

 

Quer o ser humano compreenda ou não o mundo dos arquétipos, eles existem e em razão disso a sua existência deve ser considerada:

  

O homem deveria dar atenção ao sábio conselho da mãe e obedecer à lei inexorável da natureza que delimita todo ser. Jamais poderia esquecer que o mundo existe porque os seus opostos são mantidos em equilíbrio. O racional é contrabalançado pelo irracional e aquilo que se planeja, pelo que é dado (JUNG, 2007, §175).     

 

Entretanto, já existiam discórdias de opiniões e pensamentos aristotélicos em relação a estes arquétipos. O filósofo Platão reconheceu no arquétipo, uma idéia preexistente e super ordenada nos fenômenos em geral, e na figura divina. Em sua análise sobre a existência humana, ele pontua que Deus é um arquétipo e nele está contida a idéia de que é ‘preexistente ao fenômeno luz’ e ainda a imagem primordial ‘super-ordenada’ a toda e qualquer espécie de luz. Do mesmo modo, compreendem-se outros arquétipos como da mãe, uma imagem primordial, e preexistente no fenômeno materno’, e no sentido amplo do seu modo de ser. Jung enfatiza que os arquétipos são considerados parte da natureza e está conectada às suas raízes, com uma visão de mundo, uma ordem social e que cinde o ser humano das suas imagens primordiais. 

 

Dentro desta visão científica fica entendido: “O arquétipo nada mais é do que uma expressão já existente na Antiguidade, sinônimo de ‘idéia’ no sentido platônico” (JUNG, 1976, §149).

 

A partir das concepções acima referidas, concluímos que a imagem primordial ou arquetípica, é uma figura, seja ele demônio, ser humano ou processo que reaparece no decorrer da história, sempre que a imaginação criativa for livremente expressa. É, portanto, em primeiro lugar, uma figura ‘mitológica’. Examinando essas imagens mais detalhadamente, constataremos que elas são, de certo modo, os resultados formados por inúmeras experiências típicas de toda uma genealogia ancestral.

 

Clarinha, Jung e o Subconsciente

 

Aqui nos propomos registrar as PES de Clarinha e em paralelo a isto, transcrever as de Jung, tomando por base os pilares da teoria, que ele próprio idealizou e consequentemente criou. Ao referenciar estes ‘sensitivos’ (cada um ao seu tempo) e enquanto ser humano tentou mostrar aos nossos leitores como eles enfrentaram as janelas do subconsciente.   

 

Como Jung, Clarinha e outros mortais do planeta Terra já vivenciaram estas emoções fenomenológicas. Neste contexto pelas ‘coisas’ do sagrado Radin cita em seu livro “Mentes Interligadas” Willam Blake, referenciando uma das suas excelentes frases digna de reflexões: “Como é que você não sabe que cada pássaro que cortar os caminhos aéreos é um imenso mundo de delícias, inacessível aos seus cinco sentidos” (RADIN, 2006, p.31). 

 

Corroborando este depoimento, inserimos na íntegra um trecho do Diário de Clarinha em seus momentos de intensa subjetividade:

         

Meus sonhos são incríveis e todos eles trazem-me lições de vida, e funcionam como centelhas divinas para o que ainda está por vir. Através deles, compreendo que me reencontro com as minhas memórias ancestrais e nesse vivenciar, nem tudo são flores porque os meus arquétipos se manifestam em ambientes de trevas ou pouco iluminados. Contudo, quando consigo elevar a minha sintonia vibracional, ainda dá para recuperar-me do mundo trevoso e perceber a luz no fim do túnel-meu aprendizado. Entendo que a partir daí, fico repleta de magias e sabedoria. Percebo uma ambientação com tonalidade de cores diferentes das luzes que se acendem no planeta Terra. E naquele espaço sinto uma energia riquíssima de Paz e Sabedoria, ao tempo que sou recepcionada pelos Mestres da espiritualidade. E ainda sou instruída de como proceder com as pessoas aqui na terra e compartilhar com elas momentos de evolução espiritual. Sou advertida solenemente sobre as Leis Universais as quais me fazem compreender que, talvez, não seja necessário frequentar ambientes que ostentam riquezas, falatórios desconexos sobre a realidade surreal. Em troca disso, tento evoluir espiritualmente e compartilhar para que haja sempre em mim uma conexão deste planeta com o poder Absoluto (CLARINHA, 2001, p.33).

 

E ainda (2000, p.19): 

 

Certa noite tentei recolher-me mais cedo. Parcialmente cansada, intuí que algo poderia acontecer nas ‘caladas’ da noite cósmica. Um sonho muito interessante invadiu o meu ser. Através dele, adentrei em outra dimensão, onde o espaço era decorado com uma luminosidade ‘azul índigo’.Não percebia ninguém ao meu redor.Perscrutei apenas que estava desacompanhada, porém, corajosamente adentrei em u.m espaço extremamente purificado e de uma paz indescritível. Parecia-me entrar no Céu. Caminhei alguns metros compassadamente, e eis que de repente, parei num local onde encontrei uma câmara de vidro quadrada e cheia de uma névoa cristalina e circulante. Essa névoa imantava o interior da câmara e dentro dela, duas jovens gestantes, obedeciam a regras de um ritual rico de energias. Uma das garotas era minha amiga. As jovens estavam grávidas, vestidas de branco - de calçinha e sutiã. Lindos arranjos de ‘alvas flores’, compunham o véu e a grinalda. O que nos confirmou que elas já haviam passado pelo ritual do casamento. Ao me posicionar diante da câmara, sorri para a amiga e bati levemente na porta, visto que eu pretendia visitar aquele ambiente surreal. De repente uma voz superior avisou-me que eu não poderia adentrar naquele ambiente, pois se tratava de um momento de ‘purificação’ daquelas gestantes, e explicou: “Essas mães estão em estado de ‘graça e purificação’. Os seus rebentos vão habitar o planeta Terra. São crianças ‘índigos’ e extremamente ‘intuitivas e sensíveis’ às coisas do sobrenatural” (CLARINHA, 2007, p.19).

 

Entendemos que de conformidade com a teoria Junguiana, é provável que Clarinha tenha vivenciado uma experiência arquetípica do seu vivenciar sutil. Neste contexto Jung pontua:

 

O arquétipo - e nunca deveria esquecer-nos disso - é um órgão anímico, presente em cada um. Uma explicação inadequada significa uma atitude equivalente em relação a esse órgão, através do qual este último pode ser lesado [...] Ele representa ou personifica certos acontecimentos instintivos da psique primitiva obscura, das verdades, mas invisíveis raízes da consciência. O elementar significado da conexão com essas raízes é - nos mostrado pela preocupação da mente primitiva com a relação a certos fatos ‘mágicos’, os quais nada mais são do que aquilo que designamos por arquétipos (JUNG, 2007, §271/272).

                    

Diante deste conceito, compreendemos que o sonho de Clarinha ora descrito, se enquadraria perfeitamente dentro do ‘arquétipo materno’ e ou também do ‘arquétipo do filho’, porque estes complexos subjetivos estão sempre presentes na origem das ‘neuroses infantis’ e outros conteúdos do gênero. Nesses escritos ficou compreendido que é a esfera ‘instintiva’ da criança que se encontra perturbada e constela arquétipos, que se interpõem a esta dualidade: mãe e filho.

   

Se Jung estivesse na posição de um analista talvez auxiliasse Clarinha interpretar este sonho, e desvendar os mistérios deste arquétipo, tão bem representado pelas figuras mãe e filho, um futuro em potencial, ou seja, uma antecipação de desenvolvimentos e crescimentos futuros. Por outro lado, neste mesmo sonho, estão contidas cenas não somente do arquétipo do filho, mas, todavia, o ‘arquétipo da Virgem, ou da Grande Mãe’. Para a ex- discípula de Jung, Nichols, este arquétipo assim se resume:

 

O arquétipo da Virgem prendeu a imaginação de artistas e escultores durante séculos e para cada mulher, a gravidez a assinala como a pessoa escolhida para ser portadora de um novo espírito. Hoje, porém, ela se tornou ativa de outro jeito, pois foi a virgem, ao que parece, que inspirou o que é mais verdadeiro feminino e corajoso no movimento de libertação das mulheres. Assim como a Virgem Maria, foi escolhida para um destino unicamente seu, no qual havia ‘quarto na estalagem’, assim a mulher é hoje convocada a fim de realizar-se de maneira para as quais a nossa sociedade coletiva ainda fecha suas portas (NICHOLS, 2007, p.29).

  

Outro sonho extraído do Diário de Clarinha, contendo o arquétipo materno:

 

Um esgoto de água muito escura e cheia de resíduos: papéis e outros elementos da terra. Na superfície daquele espaço uma ‘mão jovem’ pediu-me socorro. Ela estava acompanhada de um jovem, mas submersos naquela água escura. A pessoa insistia sobreviver apesar das angústias. Uma senhora que presenciava a cena falou: ‘tenha coragem, segure na minha mão que eu vou te ajudar’. A garota deu a mão àquela senhora e saiu da água vestida de branco De acordo com a cena, a senhora pediu ajuda superior e eis que de repente uma tempestade lavou a cena do sonho e transforma a vida daquela moça (CLARINHA, 2007, p.15).    

 

A partir deste sonho, Clarinha confidenciou que entendeu na mensagem onírica, o caráter futuro do arquétipo, de uma mãe talvez preocupada com o ‘por vir’ do filho. Na visão de Jung o depoimento:

                   

O motivo da criança não representa apenas algo que existiu no passado longínquo, mas também algo presente; não é somente um vestígio, mas um sistema que funciona ainda, destinado a compensar ou corrigir as unilateralidades ou extravagâncias inevitáveis da consciência (JUNG, 2007, §276).

 

Na teoria Junguiana, o ‘arquétipo materno’ contém em sua dimensão vários aspectos como, por exemplo, a mãe e a própria avó e outras com as quais o ser humano se relaciona. Em sentido mais amplo, pode referir à Universidade, à Igreja, ao céu, a terra e as florestas. Um aspecto fundamental do motivo da criança é o seu futuro.  

 

Neste caso, compreende-se que estas considerações Junguianas indicam os traços que marcam os atributos do arquétipo maternal. A mágica autoritária do feminino, uma elevação espiritual, ou uma sabedoria além do uso da razão. Dentro destas figuras arquetípicas o próprio Jung adverte que todos estes símbolos podem ter sentido positivo, negativo ou nefasto para a existência humana. Voltando aos arquétipos de Clarinha, torna-se necessário expor outro sonho vivenciado por ela, por ocasião de um procedimento cirúrgico de um amigo seu.Este sonho foi vivenciado em Junho de 2009.

 

Esta manhã adentrei num espaço hospitalar onde estavam presentes o céu e o mar. Um clarão da cor alaranjada emerge por trás do oceano no formato de uma ‘mandala e/ou similar a uma roda da fortuna, um símbolo do Tarô. Esta visão mental foi captada por mim às 09h00min, exatamente no momento em que o meu amigo estava sendo submetido ao procedimento cirúrgico. O movimento deste símbolo mandálico, seguia em seus movimentos o sentido horário dos ponteiros de um relógio. Decididamente este cenário que se apresentou na minha tela mental transmitiu-me a idéia que, naquele momento da cirurgia, existe a vida de um ser humano e também um Ser Supremo a movimentar todo aquele simbolismo terrestre onde estavam presentes o médico, o paciente e o universo. Nitidamente a imagem de Deus manifestou-se em mim. (CLARINHA, 2009, p.28). 

 

Para Jung, é impossível provar a existência dos arquétipos ou dos instintos, a não ser que eles mesmos se manifestem de maneira concreta. Provavelmente a verdadeira essência do arquétipo não pode tornar-se consciente, a sua natureza pode ser transcendente ou psicoíde. A imagem de Deus não coincide propriamente com o inconsciente em sua fatalidade. É este último que não sabemos separar empiricamente da imagem de Deus. Poderemos considerar a imagem de Deus como um reflexo do Si-mesmo ou inversamente ver no Si-mesmo uma Imago Dei in homine, que significa “ver o homem à imagem de Deus”.

 

A partir deste sonho fenomenológico, Clarinha confessa que provavelmente tenha vivenciado em sua visão cósmica uma experiência sutil a partir do arquétipo da Imagem de Deus.

 

Outro sonho de Clarinha:

  

Esta noite adentrei na floresta verdejante e calma. Num determinado momento, deparei-me com um espaço circular parecido com um poço. Do alto do firmamento presenciei que a água caia dentro deste espaço de modo lento e gotejante. Fiquei observando o processo sem medo, apesar de estar sozinha. De repente, surgiu à minha frente um cigano e juntos adentramos naquela floresta. Quando retornamos, o poço estava vazio. A água em seu movimento circular voltou aos lençóis freáticos do seio da terra. E daí irrompeu do âmago da terra uma árvore enorme e cheia de frutos. Acordei, refleti esse sonho por vários dias (CLARINHA, 2009, p.70).

 

Indagando Clarinha a cerca dos seus sonhos arquetípicos, ela se expressa: “Na teoria Junguiana, o círculo tem poderes mágicos. Através da minha vivência, compreendi o poço que estava inserido na cena onírica do meu sonho representou uma simbologia toda especial e rica de magia”. 

 

Jung (2006) costuma referir-se ao círculo (mandala) como símbolo do ‘centro, da meta e do Si-mesmo’, enquanto uma ‘totalidade’ psíquica. Um momento da auto-representação de um processo inconsciente. E neste sonho, extremamente rico de símbolos, é provável que eu como mulher tenha vivenciado o arquétipo da origem do mundo ou da criação do Universo, muito bem representado pelas imagens simbólicas de um homem e de uma mulher. 

 

No sonho a seguir, outro episódio que lembra em sua estrutura um arquétipo da morte:    

                  

Certa noite eu fiz uma viagem impressionante. Adentrei num cemitério tipo ‘campo santo’. Dentro daquele espaço uma Entidade, apresentou-me aos mortos. Pareceume tratar-se do Mago, o mestre da espiritualidade. Nesse tempo de visitação percebemos vários corpos guardados em suas caixas mortuárias. Visualizei o rosto de todos eles e por último, vi um corpo com um rosto de mulher. Era estranho. Uma pele macerado parecendo celulóide, e era o meu rosto! Assustada, indaguei ao meu Mestre de quem se tratava. Então o mestre respondeu: “Essa figura é você”. E Indaguei: Vou morrer agora? “Não”. Respondeu o Mestre. “Mas, pense e reflita sobre ela” (CLARINHA, 2000, p.20).

 

Este sonho configurou-se como uma memória ancestral de grandes significados e nela está contido o arquétipo da morte. Tudo nos faz compreender que este vivenciar onírico contribuiu para que Clarinha, mais uma vez, se confrontasse com o seu inconsciente. Por causa deste sonho, torna-se pertinente uma citação Junguiana, em relação a tudo que lhe faz sentido no ato de “viver o seu morrer”.

 

Não desejo, nem deixo de desejar que tenhamos uma vida após a morte e absolutamente não cultivo pensamento dessa ordem, mas para não escamotear a realidade, é preciso constatar que, sem que, o deseje ou procure idéias desse gênero palpitam em mim. São verdadeiras ou falsas? Eu ignoro, mas constato sua presença e sei que podem ser expressas desde que não as reprima constrangido por um preconceito qualquer (JUNG, 2006, p.347). 

 

Outra lembrança de Clarinha, aos cinco anos, quando foi ‘surpreendida’ pelo arquétipo da morte. E numa certa tarde ensolarada nos relatou num só fôlego como a sua vizinha e namorada do seu irmão, veio a óbito como portadora de tuberculose pulmonar. Em poucos dias a vizinha ficou muito magra pálida e exaurida. Naquela tarde percebemos a riqueza de detalhes sobre a “passagem’’ daquela senhora. Uma experiência vivenciada por Clarinha que a deixou fragilizada por vários dias. Para completar aquele quadro fúnebre a amiga assistiu o velório, escondida dos seus familiares. 

                     

Em sua autobiografia, Jung (2006) registrou fatos importantes para ele e que estavam ligados à morte de um pescador. Como Clarinha, o cientista vivenciou também quando criança cenas relacionadas ao arquétipo da morte. Uma cena horripilante que o deixou deveras impressionado. Longe do ‘olhar’ dos seus familiares, o pequeno Jung observou próximo da sua casa a chegada do cadáver. Ele quis presenciar o desenrolar daquela cena cheia de mistérios. Na íntegra o pequeno trecho do livro do cientista que registra a ‘passagem’ de um certo ser humano:      

               

Os pescadores encontraram um cadáver logo abaixo das quedas do Reno. Querem levá-lo para a lavanderia! Meu pai disse: ‘Sim [...] Sim!’ Eu logo quis ver o cadáver. Minha mãe me deteve e proibiu-me terminantemente de ir ao jardim [...] Este fato interessou-me extraordinariamente. Nessa época eu ainda não tinha completado quatro anos (JUNG, 2006, p.36). 

 

Dando continuidade às nossas pesquisas descobrimos que Jung tinha curiosidades em relação à vida após a morte. Uma prova concreta das similaridades existentes entre estas criaturas de Deus e dotadas de um ‘perfil incomum’. Quando o tema da morte do pescador veio à tona, o pequeno Jung explorou mais detalhes daquele evento. Saiu às escondidas da sua mãe, apesar de detido de ir ao jardim da sua casa, deu a volta pelo jardim e descobriu atrás da sua residência uma vela acessa e ao lado dela uma água sanguinolenta escorria lentamente. Aproximadamente com quatro anos de vida, este fato, marcou profundamente sua vida e lhe despertou extraordinário interesse pelo tema da morte. 

 

Eventos Retrospectivos de uma Sensitiva

 

Neste tópico estão escritos os eventos sensoriais de Clarinha em caráter retrospectivo e com a riqueza dos detalhes. Relatos das PES de uma jovem trilhando pelo viés da ‘paranormalidade’.

 

Certa ocasião, por volta do meio dia, ao repousar do almoço, Clarinha se percebeu diferente do seu estado de consciência plena. Algo diferente instalou-se dentro do seu ser e da sua alma. Um sentimento estranho, como se desdobrasse para mares longínquos e adentrasse numa outra dimensão. Sentiu uma sensação de leveza indescritível, uma completude e, notadamente, não sentia mais o seu corpo físico. Ficou muito leve e flutuou pelos espaços siderais. Comportamento semelhante aos pássaros, que sobrevoam na imensidão do firmamento, descomprometidos com o seu existir e firmes nas suas revoadas absorvendo o prazer de uma intensa liberdade e magia. 

 

Aquela sensação muito estranha apoderou-se dela, tomou conta do seu ‘ser’ e instalou-se peremptoriamente em Si- mesma. Percebeu-se numa outra dimensão e diretamente conectada ao Cosmo, para tornar-se uma mera expectadora de um espetáculo surreal. De outro plano vibracional, Clarinha percebia o seu corpo físico totalmente inerte na cama, presa por um ‘cordão de prata’ e sensivelmente ligada a outras dimensões.

 

Na percepção sutil, nossa amiga visualizou imagens oriundas de uma tela projetada pelo Universo e nela a presença de uma criança de três anos conduzida por um Mago Oriental caminhando num deserto em direção ao sol nascente. Esta visão deixou-a perplexa e indagouse onde buscar referencias urgentes para responder estas questões. No seu observar cauteloso, presenciou os minúsculos pés da criança, a deslizar sobre a areia daquele espaço, rico de magias e ao mesmo tempo sagrado. Por outro lado, à distância Clarinha percebia aquele casal envolvido numa névoa transcendental, que os protegiam do frio, do calor e da poluição do ar do planeta Terra.  

 

O Mago vestia-se ricamente. As suas vestimentas eram alvas e sem máculas, a sua cabeleira longa estava presa a moda ‘rabo de cavalo. Por sua vez, a criança apresentava-se sem roupa, descalça e a sua compleição física inspirava cuidados: segurança, amorosidade, bondade, beleza e sabedoria. Ela aparentava estar saudável, porém preguiçosa ao ter que enfrentar aquele caminho árido e totalmente desconhecido para ela. Clarinha nos tem revelado que o Mago se comunica com ela de modo sutil, através de uma comunicação telepática. Um entrelaçamento sobrenatural, semelhante à luz numa velocidade idêntica aos raios dos relâmpagos quando riscam o firmamento nas tempestades das noites cósmicas. 

 

O processo telepático sintoniza com o chakra da terceira visão, na altura da Glândula Pineal, naturalmente auxiliado pelo chakra do Plexo Solar, localizado alguns centímetros acima do umbigo. São mensagens sutis auxiliados por uma pessoa que a conduzem pelos caminhos sagrados oriundas desse Sábio, que resiste com ela a tudo e a todos nas questões do seu existir. Na saudade, tristeza, solidão, decepção, angústia e inseguranças que permeiam no universo e no planeta Terra. 

 

No sonho com o Mago, Clarinha compreendeu que vivenciou um episódio sutil, numa escala retrospectiva do seu renascer e que se configurou a partir dos três anos. Assim como ela, Jung teve a sua primeira lembrança sutil mais ou menos a partir desta idade, quando num carrinho de bebê durante um banho de sol, no quintal da sua casa (JUNG, 2006). 

 

Podemos inferir que o Mago representou para Clarinha momentos especiais da sua vida, talvez o arquétipo do Velho Sábio. Neste vivenciar das sutilezas, a amiga compreendeu que através deste arquétipo foi advertido da existência da sua paranormalidade, um dom concedido pelo poder absoluto, a partir do seu renascimento. Na íntegra, uma concepção que fundamenta a visão arquetípica de Clarinha:

    

O arquétipo do Velho Sábio, dramatizado nos profetas Hebreus bíblicos e nos santos cristãos, é poderoso ainda hoje. Aparecem em nossa sociedade, não raro, como um guru com a cabeça embrulhada num turbante ou como um caminhante idoso e bondoso, envolto numa túnica branca e com as sandálias nos pés [...] Se recebermos um novo conhecido desta espécie com lisonjas servis ou se lhe voltarmos as costas em rejeição instantânea poderá ter a certeza de que o arquétipo está em ação. (NICHOLS, 2007, p.31).

 

Ao referenciar o Mago, o Velho Sábio, e o arquetípico da nossa amiga, vale recordar em tempo de pesquisas, que Jung refere-se em suas memórias, que durante toda a sua existência contou com a assistência efetiva e apoio superior de um espírito sábio chamado Filemon. Clarinha mais uma vez se identifica com o cientista nos aspectos da sua individualidade paranormal. Na íntegra Jung faz algumas referências ao seu amigo interior e se expressa com mestria em relação a ele.

 

Psicologicamente Filemon representava uma inteligência superior. Era para mim um personagem misterioso. De vez em quando tinha a impressão de que ele era quase fisicamente real. Passeava com ele pelo jardim e o considerava como uma espécie de guru, no sentido dado pelos hindus a esta palavra (JUNG, 2006, p.219). 

 

Inferimos que o espírito Filemon foi para Jung, o que o Mago representa para Clarinha uma ‘entidade superior’ que a auxilia pelos caminhos da transformação e da transmutação como podemos observar:

    

Filemon da mesma forma que outros personagens da minha imaginação trouxeramme o conhecimento decisivo de que existem na alma coisas que não são feitas pelo eu, mas que se faz por si mesmas, possuindo vida própria, Filemon representa uma força que não era eu [...] Em imaginação, conversei com ele e disse-me coisas que eu não pensaria conscientemente. Percebi com clareza que era ele e não eu, quem falava.Explicou-me que eu lidava com os pensamentos como se eu mesmo os tivesse criado; entretanto, segundo lhe parecia, eles possuem vida própria, como animais na floresta, homens numa sala ou pássaros no ar: Quando vês homens numa sala, não pretenderias que os fizesse e que és responsável por ele, ensinou-me. Foi assim que pouco a pouco me informou acerca da objetividade psíquica e da ‘realidade da alma’ [...] De vez em quando me fez compreender que havia uma instância em mim capaz de enunciar coisas que eu não sabia, não pensava, e mesmo coisas com as quais não concordava (JUNG, 2006, p.218-219). 

 

Neste contexto ousamos solicitar aos leitores que estabeleçam analogias consideráveis entre essas duas personalidades, através da paranormalidade. Será que no interagir de médiuns sensitivos e ou paranormais, existem gurus, espíritos e igualmente personagens misteriosos a intuí-los para as práticas das tarefas do bem ou do mal? Espero que no decorrer deste capítulo, os leitores encontrem, respostas a estas indagações.                 

  

Os Conteúdos que Reverberam na Inconsciência

  

Neste tópico apresentamos fatos inéditos do vivenciar de Clarinha pelos caminhos sagrados. Situações ‘supra-reais’, experienciadas ‘além’ das suas percepções normais. Nestes aspectos, a amiga costuma revelar que faz ‘viagens’ quando está dormindo e que nas ‘caladas da noite’ segue ‘voando’ em direção aos portais do autoconhecimento, para visitar outros umbrais ‘intramundos’. Os seus relatos chegam a descrever cenas de natureza sutil impressionantes. Seus depoimentos nos levam a entender que quando vivencia estes eventos, está firme no seu corpo físico, mas, eis que de repente, se projeta para fora dele e segue em direção aos espaços siderais, como por encanto. 

 

O processo é dotado de grande autonomia e independente da sua vontade, ocorre, portanto, o deslocamento do seu corpo sutil, e entra no processo chamado ‘projectologia ou desdobramento astral. ’ Segundo seus depoimentos, compreende-se que sua respiração fica quase imperceptível. O seu corpo permanece inerte na cama e preso pelo “cordão de prata”. 

 

Em seu Diário, Clarinha faz registros de que, na maioria das vezes, experimenta estas vivências como um mero passageiro, de uma nave espacial, numa velocidade inexplicável e difícil de ser cronometrada. Registra que quando vivencia estes eventos, sofre um desgaste energético em seu corpo físico e sutil bastante acentuado, necessitando se refazer energeticamente no dia seguinte.Alimentar-se melhor e ainda  se utilizar das técnicas alternativas, por exemplo, alinhamento dos chakras, meditações criativas e respirações energéticas, cujo objetivo primordial é a busca da ‘cura do corpo e da alma’. Isto porque, no dia seguinte aos eventos, as dificuldades de aterramento, tornam-se bem visíveis, são dificuldades no campo da emoção, do humor e do bem estar social ao lado da família. A partir destes procedimentos sutis tudo passa a fluir de modo ordenado. E assim, tenta seguir seu destino e a sua missão, sem reclamar daquilo que escolheu. Estuda, se diverte e administra a família e consequentemente o seu caminhar.

 

Quando ocorrem os eventos, fortes ondas de energias, muitas vezes de grande intensidade e baixo poder vibracional a tornam exaurida. Por causa das ondas procedentes de dimensões inferiormente iluminadas ou totalmente submersas nos umbrais das trevas, um sentimento similar ao de Jung no processo da “descida”, sozinho e solitário.

 

Todas elas têm suma importância para a existência de Clarinha, pois lhe conferem grandes aprendizados. Neste processo ela visita terrenos transcendentais muitas vezes dotados de imenso poder vibracional. Todos os espaços são habitados por Entidades, Magos, Mestres e seres iluminados, de diversas alegorias. A cada viagem astral, a amiga apreende também a magia das noites cósmicas, nas diversas formas de um vivenciar sutilezas. 

 

Na tentativa de obter subsídios sobre os eventos de uma paranormalidade evoluída, solicitamos de Clarinha informações sobre as suas PES. No caso, a sua primeira projectologia. Um episódio similar vivenciado por Jung, quando enfermo, e por ela quando no seu processo mediúnico. Os eventos têm gerado grandes polêmicas dentro dos modelos científicos. Em tempo de sutilezas confiram na íntegra uma experiência sutil pelos caminhos da paranormalidade.             

 

A minha primeira viagem astral aconteceu de surpresa e sem perceber como tudo aconteceu. Só sei dizer que quando me percebi voava em direção a uma luz. Na ocasião saí do meu corpo físico e adentrei no túnel super escuro e fiquei apavorada com aquele fenômeno. Voava velozmente a mil por hora, e cheguei a pensar que poderia a qualquer momento sofrer um acidente mortal, isto é, bater a minha cabeça em algum lugar daquele espaço. Como foi a primeira experiência, senti pavor, mas não podia parar. Sentia o meu corpo sendo conduzido por uma força sobrenatural e que me sustentava no ar. Meus braços permaneciam abertos tais quais as asas de um pássaro voador. O pavor pelo desconhecido se apoderou de mim a ponto de indagarme a mim mesma: Onde estou? Imediatamente uma voz superior respondeu: Não tenha medo porque você não está sozinha. A partir daí, minha viagem astral continuou e eu ouvia perfeitamente o uivar do vento no interior dos meus ouvidos. Não conseguí atingir o objetivo de finalizar aquele trajeto; no caso voar para os caminhos sagrados porque acordei. Ao que tudo indica nesse sonho eu vivenciei o primeiro treinamento de minha viagem astral (CLARINHA, 2000, p.20). 

 

Outra Projectologia: Na noite passada visitei a minha cidade natal no interior do Piauí e senti saudades. Foi uma solicitação feita por mim ao Universo. Conectei-me com outras dimensões e entreguei-me ao Absoluto. Antes da minha viagem, fiz o meu ritual. Alinhei os meus corpos sutis e recitei: ‘Seja feito a tua vontade, assim na terra como no céu’. Inseri-me no firmamento, tal qual um pássaro gigante. Sobrevoei a minha cidade lentamente. Identifiquei vários pontos dantes visitados quando criança: a praçinha do largo da Igreja de Nossa Senhora das Graças, padroeira da cidade e, igualmente, outros locais que fizeram a história da minha vida. Contudo, o que mais despertou a minha intenção foi sobrevoar o cemitério onde estão sepultados alguns dos meus familiares. Inclusive os meus genitores (CLARINHA, 2000, p.31).

  

Nas páginas da teoria Junguiana encontramos conteúdos que expressam sentimentos similares aos relatos acima referidos. Em 1944, Jung (2006) fraturou um pé e logo em seguida foi acometido por um enfarte. Em perigo de morte o administraram medicamentos a base de oxigênio e cânforas, e ele percebeu-se ‘voando’. E diante dos relatos posteriores concluiu que, as imagens que desfilavam diante dele, passaram-lhe a idéia de que estaria prestes a morrer. A terra sob os seus pés estava banhada de uma luz e, igualmente o mar, de um imenso azul. Terminantemente ligados aos continentes, Jung percebeu à sua frente o subcontinente Indiano, rico de detalhes. Os contornos que circundavam a terra estavam todos luminosos e, em certas ocasiões, esses contornos se apresentavam coloridos de um verde escuro, similar à prata oxidada. Diante daquele indescritível cenário identificou e entendeu a presença da península Arábica de um vermelho alaranjado e mais nitidamente observou uma nesga do Mediterrâneo. De acordo com ele, tinha sido atingido no seu ‘limite’ e pensou estar vivenciando um êxtase ou um sonho, pois parecia estar muito alto - no espaço cósmico.

 

Diante desse cenário de luzes a sua enfermeira revela quando Jung se restabelecera: “o senhor estava como que envolvido por um alo luminoso” (JUNG, 2006, p.337). Na visão do cientista este episódio foi um fenômeno que a enfermeira às vezes observara nos agonizantes dos leitos de morte. Fazendo a analogia do perceber sutil de Clarinha como vivenciar de Jung, compreendemos que no caso desses dois sensitivos, tudo nos faz crer que ambos fizeram suas projectologias.

 

Jung no um leito hospitalar e Clarinha visitando a sua cidade natal

 

Ainda neste Diário, podemos encontrar registros da amiga referindo-se às dificuldades de alguém do seu relacionamento procurando moradia na orla Piauiense. Nesse dia Clarinha registrou que sentiu sono no início da noite e, num dado momento, percebeu-se voando nos espaços inatingíveis do planeta Terra. Igualzinho a um pássaro gigante e exímio voador. Um fenômeno de projectologia, no caso um desdobramento sutil. E se expressa em seu Diário com riquezas de detalhes:

 

Saí do meu corpo físico independente da minha vontade. Um episódio similar à retirada de um bolo inteirinho, cuja forma fica inerte sobre a mesa. Senti nesse processo intensa liberdade e quando eu atingi certa altura do espaço sideral percebi meu corpo físico imóvel, porém minhas funções respiratórias totalmente preservadas. Do alto do firmamento eu consegui vislumbrar uma cidade litorânea, e ainda notei que o sol estava prestes a surgir. As luzes que refletiam no asfalto pareciam rosários de cristal e iluminavam aquele cenário encantador. No ato do processo, não perdi a consciência, e me senti feliz, radiante diante daquela maravilha. Naquele processo vivenciei a sensação de ser portadora de duas personalidades, uma física e a outra extra-física. Ao tempo em que eu voava, percebi o meu corpo físico diferenciado do meu estado normal, pois estava inerte na cama e alimentada energeticamente através de um cordão de prata. Ao término deste vôo espacial, identifiquei que me afastei da orla e segui em frente sobrevoando o oceano lentamente até encontrar uma espécie de condomínio fechado às margens de um rio. O cenário estava leve e clareando prestes do sol nascer. Ao adentrar no condomínio, percebi alguns pontos de luz, que iluminavam residências. Os moradores ainda dormiam, talvez vivenciando os sonhos das noites cósmicas. Aterrissei naquele espaço, tal qual uma aeronave. Em seguida, adentrei numa das casas e no interior dela, recebi uma mensagem sutil de que a amiga moraria naquela casa ao lado do rio e não na orla como ela havia planejado. Dias depois, essa mesma amiga avisou-me que, o meu sonho tornou-se realidade. Para surpresa nossa ela mudou-se para o condomínio às margens de um rio, como eu já havia informado (CLARINHA, 2007, p.33). 

 

Clarinha declara que, mais uma vez identifica-se com Jung nas formas de agir, pensar e perceber o Universo numa dupla dimensão, uma ‘real e outra sutil’. Relatamos na íntegra mais um sonho vivenciado por ela nas ‘caladas’ das noites cósmicas. 

 

Sonhei esta madrugada com um amigo. O sol iluminou aquele espaço e num dado momento, fui solicitada por ele a adentrar no mar. Relutei por medo de afogar-me, mas de repente ele falou: ‘Não tenha medo da água do mar’. Se você quiser adentrála posso auxiliá-la neste processo. Em seguida o mar se abriu tal qual um longo caminho a ser percorrido por nós. Com bastante cuidado o meu amigo segurou-me pela mão e prazerosamente fizemos a travessia. Acordei no dia seguinte com essa linda mensagem reverberando em mim. (CLARINHA, 2007, p.14).

 

Do ponto de vista de Jung, colocamos a disposição dos leitores as suas concepções em relação aos arquetípicos. Uma visão que serviu de reflexões ao existir de Clarinha pelas ‘coisas’ sutis. 

 

Para apreender as fantasias que me agitavam de maneira subterrânea, era necessário descer a elas. Mas quanto a isso, eu tinha não só uma série de resistências como também sentia, expressamente angústia. Temia perder o autocontrole, tornando-me presa do inconsciente e, como psiquiatra, sabia claramente o que isto significava. No entanto era preciso ousar e tentar apoderar-me desta imagem. Se não o fizesse corria o risco de ser tomado por elas (JUNG, 2006, p.214).

     

A partir destes eventos compreendemos que a amiga vivenciava sonhos arquetípicos da mesma natureza de Jung, com todos os matizes das trevas e da luz. A cerca dessas sintonias vibracionais assim se expressa Dr. Deepak Chopra, fundador do Chopra Conter for Well Boeing, em Carlsbad na Califórnia:

 

Quando você vive a verdade da realidade única, cada segredo se revela sem dificuldades ou esforço [...] tudo se resume à antiga escolha da separação ou da unidade. Você quer ficar fragmentado, em conflito, dividido em outras forças das trevas ou da luz? Ou quer se afastar da separação e fazer  parte da totalidade? Você é uma criatura que age, pensa e sente. A espiritualidade combina os três em uma única realidade. O pensamento não domina o sentimento; o sentimento não resiste ao cérebro superior; a ação tem lugar quando pensamento e sentimento dizem juntos: Isto está certo (CHOPRA, 2004, p.14/15).

                       

A Precognição nos Eventos Paranormais

 

Os relatos paranormais de Clarinha mostram a sua capacidade perceptiva à distância. No caso, o exercício do seu poder precognitivo de perceber os fatos ao redor do mundo, ao redor de si, e em outras dimensões. Um processo subjetivo do qual a amiga é detentora a partir do seu renascer. Quer dizer, possui um dom sobrenatural do qual tomou conhecimento e com detalhes através do acompanhamento terapêutico. 

 

Para maiores esclarecimentos sobre os registros das suas subjetividades apresentamos a descrição de alguns dos seus sonhos em estado desperto. No caso, vivenciando as duplas personalidades das quais já nos referimos anteriormente, a um e a dois.

 

Observei na minha tela mental, em estado desperto, que existe na residência da minha amiga, Senhora M, uma energia estagnada e que envolve a cadeira da sala na qual costuma fazer o atendimento da sua clientela. A energia simboliza um cenário nada auspicioso para as suas tarefas profissionais. Dias depois destas alegadas, outro sonho denuncia a existência de um cenário assustador no qual ela chora solitária debaixo de uma árvore, em meio às tempestades e trovões. Em relação a esse momento sutil, entrei em contato com a Senhora M e relatei o sonho que tivera com ela e ainda adverti: tenha muito cuidado com a Justiça, visto que recebi a mensagem de uma Entidade Cósmica que assim se resume: ‘O processo que ocorre com a sua amiga é similar a um barco que se encontra à deriva’. Dias posteriores, a amiga revelou-me que estava passando por dificuldades financeiras e por causa disso, contraído muitas dívidas. E, igualmente estava enfrentando problemas com a moradia, a ponto de ser despejada judicialmente. Após os relatos das suas dificuldades e em certa ocasião constatamos que este processo se consumiu de fato e de modo inesperado ocorreu o despejo oficial. (CLARINHA, 2002, p.5).

 

Sonhos Recorrentes

 

Aqui transcreveremos eventos que simbolizam os estados sutis nos quais Clarinha se ‘percebe’ diante de Jung nas noites cósmicas, sob os efeitos de um imenso temporal. Tratavase de sonhos vivenciados por ela quando da sua participação em dois seminários sobre o existir de Jung, ministrados pelo psiquiatra e terapeuta transpessoal Dr. Roger Woolger. Durante estes seminários, ela vivenciou o evento, no qual conhece o mestre da psicologia analítica. Um homem alto, retilíneo, vestido de terno e gravata que portava uma bengala, na mão esquerda e na direita, conduzia um cachorro de raça desconhecida.

 

Aquele homem caminhou durante longas horas numa estrada escura e banhada por uma chuva torrencial cujos pingos assemelhavam-se às gotas de cristais. Nas margens dessa estrada, Clarinha estava sozinha, e ao presenciar a passagem daquele homem elegante e sozinho, ela lhe fez uma indagação a qual foi imediatamente respondida. “Você vai segurar a minha mão”? Ao que ele respondeu com um frio “não”! Clarinha quis saber o ‘por que’ da decisão do elegante senhor. Respondendo àquela indagação ele assim se expressou: “Por que você já escolheu o seu caminho”. Em seguida, o homem desconhecido e solitário, continuou o seu caminhar e diante dela confidenciou: “Siga-me”!

 

No dia seguinte à noite, Clarinha foi ao seminário e durante as projeções cinematográficas, surpreendeu-se ao presenciar diante dela o homem solitário do seu sonho. Neste caso a amiga intuiu que aquele evento foi uma forma sutil de ser apresentada a Jung, o mestre da Psicologia Analítica.        

 

Em conformidade com ela, os seus eventos obedecem a um critério recorrente, ou seja, costumam ser repetitivos e por longos dias seguem as mesmas trajetórias e as mesmas mensagens. Todavia, costumam deixar mensagens de evolução espiritual através das quais, já ficou provado, ao longo da existência de alguns paranormais, que nessa fenomenologia nem tudo são flores, pois costumam gerar desconforto a ponto de fragilizar os seus portadores. Quando mal avaliados na área da saúde, estes sensitivos sofrem as consequências disso. Tornam-se fragilizados, incompreendidos, exauridos e parecem perder a alegria de viver neste planeta. 

 

Convém ressaltar que suas visões têm uma escala progressiva e se manifestam até hoje na maturidade. São sonhos repetitivos que às vezes se apresentam com os mesmos cenários - castelos medievais, montanhas, florestas e comunidades ciganas, cujos personagens ostentam indumentárias com jóias e pedrarias. Em sua maioria, estas sutilezas transmitem à Clarinha uma mensagem fraterna, espiritualista e universal.

 

Von Franz escreve em sua obra “O caminho dos Sonhos” (1988, p.24): “vários documentos demonstram que muitos cientistas primeiro sonharam certas soluções matemáticas e depois as resolveram conscientemente. Devemos, então, concluir que existe uma matriz psíquica capaz de produzir novos insights”. 

 

Casos assim têm ocorrido com muita frequência com Clarinha. Certa ocasião, meados de agosto de 2007, conversando com ela sobre sonhos, fantasias e outros eventos, ela nos confidenciou um sonho recorrente. Adentrando num cemitério ela encontrou as flores que emergiam do solo e uma saliência que se movia em direção ao céu azul e, do interior da terra, jorrava uma salmoura como se fora movimentos provocados por alguém que se encontrava sob as gramas daquele campo. Foram várias noites de sonhos e pesadelos. 

 

No dia seguinte a este sonho, ela resolveu falar para os seus familiares sobre este evento, e relatou que estava temerosa por causa do teor das mensagens, pois envolviam a ‘passagem’ de alguém da família. Dias depois, através de um telefonema, os familiares dela recebem a notícia do falecimento de uma prima. Aqui vale relembrar que Jung vivenciou também experiências desta natureza, como seja alusivo a um evento premonitório, e se expressa em sua autobiografia:

 

Dada a relatividade do tempo e de espaço no inconsciente, é possível que eu tenha percebido o que se passara, em realidade, num outro lugar. Esse fenômeno adverte Jung: o inconsciente coletivo é comum a todos os homens; é o fundamento daquilo que a antiguidade chamava de ‘simpatia de todas as coisas’. No caso em questão, meu inconsciente conhecia o estado do meu doente. Durante a noite inteira eu experimentara um nervosismo e uma inquietação espantosa, muito diferentes do meu humor usual (JUNG, 2006, p.172). 

 

Neste caso, o cientista se reporta a um dos seus sonhos onde a figura central do evento fora a figura de um paciente que se suicidou. De fato, no dia seguinte ao sonho, ele acordou movido por constates ansiedades e nervosismo e, por assim dizer, fragilizado. São essas as informações que deixaram Clarinha impressionada visto que, em casos semelhantes confessa sentir também certos incômodos.

 

Em consonância com o Diário de Clarinha, transcrevemos outro sonho (2008, p.33): Sonhei durante o dia e fiz uma viagem interessantíssima. Visitei uma comunidade com poucas casas. Hospedei-me numa delas e, no período da tarde sentei-me na varanda para descansar do almoço. De repente, vi ao longe, uma lagoa azul cercada de árvores por todos os lados. Do interior daquela paisagem, surgiram como por encanto duas jovens, vestidas de branco e, ambas portavam lindas flores. No alto dos cabelos, verdadeiras grinaldas. Ambas carregavam nos braços uma enorme peneira artesanal montada com fibras de palhas nativas. Elas se posicionaram diante do lago e colocaram a peneira dentro da água. E eis que de repente presenciei dois peixes de prata a se movimentarem no centro da peneira. No caso, os seus movimentos evidenciavam que estava entranhando aquele espaço como um seguimento do seu habitat natural. De repente, indaguei ao meu eu superior do que se tratava. E em tempo a minha voz interior respondeu prontamente sobre o significado do meu sonho arquetípico. ‘Nunca dê os peixes a alguém, ensine-o a pescar’.

 

Vale registrar outro sonho que aconteceu numa noite de verão, no princípio de 2009, que nos deixou impressionadas e preocupadas, como sendo uma mera coincidência. Um sonho com um cenário parecido com um cemitério do tipo “Jardim da Saudade[28]”, terreno plano e todo ajardinado com as mais belas flores do Universo. Clarinha adentra na morada dos mortos, observa os mínimos detalhes daquele espaço e, num dado momento, dirige-se a um ponto do cemitério. Neste local, percebeu uma saliência na grama, que se movimentava assustadoramente, e do seu interior emerge uma ‘salmoura sanguinolenta’. Clarinha percebeu uma pulsação na saliência da grama similar aos batimentos cardíacos de um ser humano. 

 

No dia seguinte Clarinha sonhou novamente. Esse sonho perturbou tanto a amiga que ela resolveu falar aos seus familiares e já premonitando: “Tive um sonho estranho durante três noites seguidas e tudo indica que vai morrer alguma pessoa de nossa família” (Clarinha, 2008, p.33). A partir daí, os seus familiares ficaram atentos àquelas mensagens e imaginaram bons dias para que nada ocorresse de ruim com eles. O certo é que depois de alguns dias o esposo de Clarinha recebeu um telefonema avisando que uma prima dele tinha sofrido um Acidente Vascular Cerebral (AVC) e por conta da gravidade do caso, veio a óbito.

 

Os Sonhos e os Eventos Sincronísticos

 

Nos capítulos anteriores discorremos sobre a sincronicidade e para ilustrar estes textos inserimos uma vivência da amiga que se assemelha a um evento sincronístico: Em Maio de 2009, Clarinha procurou fazer uma cura quântica através do método Reikiano (incluindo meditação e movimentos respiratórios) e cai no ‘vazio’. 

 

Neste processo, ela sai do seu corpo físico e viaja pelos espaços siderais. Adentra num palácio ricamente adornado com uma pomba na mão. Na sua mente sutil, um forte pensamento surgiu em buscar a sua consciência. A decoração do ambiente tinha as tonalidades do “ouro velho” e do “vermelho escarlate”. No interior daquele palácio, encontrava-se uma Imperatriz a esperála, ricamente vestida e coberta de jóias, da cabeça aos pés. Da porta principal até a Imperatriz, Clarinha caminhou durante horas, sobre um tapete vermelho, mantendo-se ereta para não fugir das normas e do ritual daquela casa ancestral. Quando a amiga chegou diante dela colocou a pomba nos seus braços. No curto espaço de tempo, esta pomba foi se multiplicando em milhares dela e sutilmente alcançando os seus vôos pelas laterais dos nossos corpos em direção ao firmamento. Depois dessas intensas revoadas a pomba voltou pros braços de Clarinha. Como num passe de mágica tornou-se a própria Imperatriz, isto é, Clarinha introjetou-se nela, tornando-se individualizada ou o mesmo que dizer uma única pessoa dentro da sua unicidade própria. 

 

Depois deste processo, Clarinha voltou a ser Clarinha novamente, dentro da sua inteireza. Com a sua pomba nas mãos foi visitar as demais dependências do palácio. Nossa amiga presumiu que no interior desse palácio havia várias escadas, pois quando olhou para o alto das paredes presenciou imensas varandas, com um grande número de anjinhos, todos sorridentes, arremessando flores para ela, que em estado de pleno deslumbramento acorda. 

 

No dia seguinte, ela nos confidencia este sonho com riquezas de detalhes. Coincidentemente a este evento e na mesma semana, Clarinha foi convidada para o lançamento do livro de um amigo. Ao aproxima-se da mesa onde a obra estava exposta percebe que a capa do livro fora uma tela elaborada pelo artista plástico Babalú[29], cuja mensagem surreal retrata a figura de uma pomba sobrevoando a imensidão do oceano ricamente adornado por peixes e corais. Este motivo é a representação surreal da obra de arte deste artista plástico, já falecido. O sonho de Clarinha ‘bateu em cheio’ com as motivações que a levaram àquele evento espetacular, o lançamento do livro do seu amigo, cujo teor das mensagens versa sobre o existir do ser humano em busca do conhecimento.

 

A partir destas considerações sobre os arquétipos, concluímos que o psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, foi o pioneiro nas pesquisas dos sonhos e/ou dos seus significados para o inconsciente de um ‘ser pensante’. Em suas memórias, ele pontuou que esse material onírico é responsável pelo equilíbrio das energias físicas e mentais das pessoas. E repetindo mais uma vez um conceito Junguiano, na íntegra a visão geral do psiquiatra alusiva ao ato de sonhar enquanto adormecidos e/ou acordados.

 

O sonho é uma porta estreita, dissimulada naquilo que a alma tem de mais obscuro e íntimo; essa porta se abre para a noite cósmica original, que continha a alma muito antes da consciência do eu e que perpetuará muito além daquilo que a consciência individual poderá atingir. Pois toda consciência do eu é esparsa; distingue fatos isolados, procedendo por separação, extração e diferenciação; só o que pode entrar em relação com o eu é percebido (JUNG, 2006, p.496).

 

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